1.3. O processo de análise de mercados


Em 17 de dezembro de 2007, a Comissão Europeia (CE) publicou a Recomendação sobre mercados relevantes revista - Recomendação 2007/879/CE1, a qual substitui a Recomendação da Comissão 2003/311/CE, relativa aos mercados relevantes de produtos e serviços no sector das comunicações eletrónicas suscetíveis de regulamentação ex-ante em conformidade com a Diretiva 2002/21/CE2 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (doravante Recomendação).

A atual Recomendação prevê sete mercados relevantes, um a nível retalhista3 e os restantes seis a nível grossista4.

Tal como na anterior versão da Recomendação, a atual é acompanhada de uma "Exposição de Motivos"5 onde a CE justifica a definição dos novos mercados.

O mercado presentemente em análise, atual mercado 3 (mercado 9 da "anterior Recomendação") tem a seguinte designação:

  • Mercado 3: Terminação de chamadas em redes telefónicas públicas num local fixo.

A Lei n.º 5/20046, de 10 de fevereiro, alterada e republicada pela Lei n.º 51/20117, de 13 de setembro (doravante Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE))8, aprovou o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações eletrónicas e aos recursos e serviços conexos, definindo as competências da Autoridade Reguladora Nacional (ARN) neste domínio.

Compete à ARN, o ICP-ANACOM, definir e analisar os mercados relevantes, declarar as empresas com PMS e determinar as medidas adequadas às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas (art.º 18.º da LCE).

Este processo desenvolve-se de acordo com as seguintes fases (art.os 55.º a 61.º da LCE)9:

  • Definição dos mercados relevantes (art.º 58.º da LCE)

Compete à ARN definir os mercados relevantes de produtos e serviços do sector das comunicações eletrónicas, incluindo os mercados geográficos relevantes, em conformidade com os princípios do direito da concorrência.

Na definição de mercados relevantes deve a ARN, em função das circunstâncias nacionais, ter em conta a Recomendação e as Linhas de Orientação da CE10 relativas à análise e avaliação do poder de mercado significativo no âmbito do quadro regulamentar comunitário para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (daqui em diante designadas por "Linhas de Orientação").

  • Análise dos mercados relevantes (art.º 59.º da LCE)

Compete à ARN analisar os mercados relevantes definidos nos termos do ponto anterior, tendo em conta as Linhas de Orientação.

O procedimento de análise de mercado tem como objetivo investigar a existência de concorrência efetiva. Não existe concorrência efetiva caso seja possível identificar empresas com PMS11.

Considera-se que uma empresa tem PMS se, individualmente12 ou em conjunto com outras, gozar de uma posição equivalente a uma posição dominante, ou seja, de uma posição de força económica que lhe permita agir, em larga medida, independentemente dos concorrentes, dos clientes e dos consumidores.

  • Imposição, manutenção, alteração ou supressão de obrigações regulamentares (art.o 66.º da LCE)

Caso o ICP-ANACOM conclua que um mercado é efetivamente concorrencial, deve abster-se de impor qualquer obrigação regulamentar específica e, se estas existirem, deve suprimi-las.

Caso o ICP-ANACOM determine que o mercado relevante não é efetivamente concorrencial, compete-lhe impor às empresas com PMS nesse mercado as obrigações regulamentares específicas adequadas, ou manter ou alterar essas obrigações, caso já existam (art.º 59.º).

As obrigações impostas (cfr. n.º 3 do art.º 55.º):

  • devem ser adequadas ao problema identificado, proporcionais e justificadas à luz dos objetivos de regulação consagrados no art.º 5.º da LCE;
     
  • devem ser objetivamente justificáveis em relação às redes, serviços ou infraestruturas a que se referem;
     
  • não podem originar uma discriminação indevida relativamente a qualquer entidade;
     
  • devem ser transparentes em relação aos fins a que se destinam.

A presente análise de mercados foi sujeita ao procedimento geral de consulta ao abrigo do art.º 8.º da LCE, e ao procedimento de audiência prévia dos interessados em conformidade com o previsto nos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), em ambos os casos por um período de 40 dias, e foi também submetida à Autoridade da Concorrência (AdC) para que se pronunciasse nos termos do artigo 61.º da LCE.

Por comunicação de 13.05.2013, a AdC emitiu o seu parecer tendo genericamente referido concordar com o SPD do ICP-ANACOM. Em concreto, a AdC refere que não se opõe à definição dos mercados do produto e geográficos relevantes, nem às avaliações de PMS realizadas pelo ICP-ANACOM no presente SPD.

Refere igualmente ser favorável à eliminação da assimetria de preços entre as empresas do GRUPO PT e os restantes operadores e com a escolha da metodologia de custeio de custos incrementais de longo prazo (LRIC) ''puro'' para estabelecer o preço de interligação.

No âmbito dos procedimentos de consulta e de audiência prévia dos interessados, o ICP-ANACOM recebeu respostas de 9 entidades, entre as quais uma associação de consumidores e 8 operadores.

Analisados os comentários, foi preparado um relatório relativo ao sentido provável de decisão (SPD) do ICP-ANACOM, o qual contém um resumo dos contributos recebidos e os entendimentos do regulador a esse respeito. O relatório faz parte integrante deste projeto de decisão final a notificar à Comissão Europeia nos termos do número 1 do artigo 57.º da LCE.

Notas
nt_title
 
1 Foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia (JOUE), de 28 de dezembro de 2007 Recomendação da Comissão 2007/879/CE, de 17.12.2007https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=963073.
2 Disponível em Recomendação da Comissão 2007/879/CE, de 17.12.2007https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=963073.
3 Mercado 1: Acesso à rede telefónica pública num local fixo para clientes residenciais e não residenciais.
4 Que são os seguintes:
- Mercado 2: Originação de chamadas na rede telefónica pública num local fixo;
- Mercado 3: Terminação de chamadas em redes telefónicas públicas individuais num local fixo;
- Mercado 4: Fornecimento grossista de acesso à infraestrutura de rede num local fixo;
- Mercado 5: Fornecimento grossista de acesso em banda larga;
- Mercado 6: Fornecimento grossista de segmentos terminais de linhas alugadas; e
- Mercado 7: Terminação de chamadas vocais em redes móveis individuais.

5 ''Exposição de Motivos'' disponível em: Nota Explicativa SEC(2007) 1483 final da Comissão, de 07.02.2008https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=990485 (apenas versão em inglês).
6 Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereirohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=930940.
7 Lei n.º 51/2011, de 13 de Setembrohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1097032.
8 Este diploma transpõe para a ordem jurídica interna as Diretivas n.ºs 2002/19/CE (Diretiva ''Acesso''), 2002/20/CE (Diretiva ''Autorização'') e 2002/21/CE (Diretiva Quadro), todas do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março, alteradas pela Diretiva n.º 2009/140/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro, a Diretiva n.º 2002/22/CE (Diretiva ''Serviço Universal''), do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março, alterada pela Diretiva n.º 2009/136/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro, e a Diretiva n.º 2002/77/CE (relativa à concorrência nos mercados de redes e serviços de comunicações eletrónicas), da Comissão Europeia, de 16 de setembro.
9 Cf. Diretiva-Quadro, art.os 7.º e 14.º a 16.º.
10 Orientações da Comissão 2002/C 165/03, de 11.07.2002https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=965114.
11 Também conforme as Linhas de Orientação (§24), ''No âmbito do quadro regulamentar, os mercados serão definidos e o PMS avaliado com metodologias idênticas às do direito da concorrência. (...) e a avaliação da concorrência efetiva pelas ARN devem ser coerentes com a jurisprudência e a prática em matéria de concorrência. Com vista a garantir essa coerência, as presentes orientações baseiam-se em: 1. Jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância e do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias no que diz respeito à definição de mercado e à noção de posição dominante na aceção do artigo 82.º do Tratado CE e do artigo 2.º do regulamento relativo ao controlo das concentrações''.
12 Note-se que, de acordo com o Acórdão TJCE, de 12 de julho de 1984, Hydrotherm, a noção de empresa ''deve ser entendida como designando uma unidade económica do ponto de vista do objeto do acordo em causa, mesmo que, do ponto de vista jurídico, esta unidade económica seja constituída por várias pessoas físicas ou morais''.
De acordo com o art.º 3.º, n. os 1 e 2, da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio (que aprova o regime jurídico da concorrência), ''1 - Considera-se empresa, para efeitos da presente lei, qualquer entidade que exerça uma atividade económica que consista na oferta de bens ou serviços num determinado mercado, independentemente do seu estatuto jurídico e do modo de funcionamento. 2 - Considera-se como uma única empresa o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, constituem uma unidade económica ou mantêm entre si laços de interdependência decorrentes, nomeadamente: a) De uma participação maioritária no capital; b) Da detenção de mais de metade dos votos atribuídos pela detenção de participações sociais; c) Da possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou de fiscalização; d) Do poder de gerir os respetivos negócios.''