Enquadramento


O ICP-ANACOM tem vindo a defender, desde a liberalização no sector das comunicações electrónicas, a existência de uma concorrência efectiva e sustentável, com recurso nomeadamente ao acesso grossista à infra-estrutura do operador com poder de mercado significativo (PMS). A obrigação de disponibilização de acesso à rede tem vindo a ser complementada por outras obrigações a ela associadas, nomeadamente pela obrigação de não discriminação e de orientação dos preços para os custos. Nesse contexto, enquadram-se, por exemplo, as medidas promovidas pelo ICP-ANACOM relacionadas com o acesso dos operadores alternativos ao lacete local.

Portugal foi precursor, nomeadamente a nível europeu, no que diz respeito à disponibilização das condutas do operador histórico para o estabelecimento de infra-estruturas concorrentes, com vista à afirmação de uma concorrência sustentada no mercado das comunicações electrónicas, em benefício dos consumidores finais. Trata-se de um percurso que teve a sua primeira expressão política na redacção do contrato de concessão do serviço público de telecomunicações (artigo 7.º das respectivas bases), reforçada posteriormente na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (artigo 26.º), e que teve depois reflexo regulatório na decisão de 17.07.2004 do ICP-ANACOM, que levou assim à disponibilização de uma oferta de referência de acesso a condutas (ORAC), na qual assume particular relevância a disponibilização de informação sobre os traçados e ocupações das condutas.

O pioneirismo da ORAC veio a revelar-se igualmente premonitório no que diz respeito à sua relevância, na medida em que assume, pela sua dimensão e capilaridade, um papel fundamental na prossecução do objectivo político inscrito na Resolução do Conselho de Ministros n.º 120/2008, de 30 de Julho: definir como prioridade estratégica para o País a promoção do investimento em redes de nova geração (RNG). Acresce que a ORAC, ao permitir o acesso de empresas de comunicações electrónicas a condutas e infra-estrutura associada visando o alojamento de redes de comunicações electrónicas daquelas empresas, adquiriu um papel muito relevante na instalação e desenvolvimento dessas redes. Tal relevância decorre ainda da dinâmica do próprio processo regulatório, que tende a considerar como concorrenciais partes significativas do mercado, situação que aumenta a necessidade de garantir formas céleres, equivalentes e eficientes de instalação de novas infra-estruturas.

Neste contexto, as condições de acesso e utilização de condutas e infra-estrutura associada da PT Comunicações, S.A. (PTC) no âmbito da ORAC 1 são um aspecto determinante para que o processo de implantação das redes de acesso em fibra óptica e o desenvolvimento dos serviços nelas suportados possam decorrer de modo concorrencial, sendo de reforçar neste âmbito a imposição de medidas que assegurem, efectivamente, uma maior equivalência e igualdade de acesso por parte do operador regulado e das beneficiárias.

É aliás neste sentido que se enquadra a necessidade de a Comissão Europeia (CE) endereçar, no âmbito da construção do mercado interno, a questão da abordagem regulatória às novas redes de acesso (NRA).

Assim, no contexto actual da evolução das redes de comunicações electrónicas, visando a oferta de débitos superiores aos disponíveis nas redes de acesso tradicionais suportadas em pares de cobre, a CE procedeu em Setembro de 2008 ao lançamento de uma consulta 2 relativa a uma primeira versão da recomendação sobre a abordagem regulatória às NRA, tendo publicado em 12.06.2009 3, uma segunda versão (e realizado uma segunda consulta pública) da recomendação e solicitado em 28.04.2010 ao Organismo de Reguladores Europeus de Comunicações Electrónicas (ORECE) uma opinião 4 sobre uma nova proposta da recomendação. A Recomendação foi publicada a 20.09.2010 5.

Esta Recomendação, tal como se antevia, prevê a necessidade de se garantir um acesso não discriminatório, em particular às condutas dos operadores com PMS, e que o objectivo de assegurar uma concorrência sustentável - level playing field - possa ser prosseguido através do fornecimento pelo operador com PMS de um acesso equivalente aos elementos passivos da sua rede 6 (princípio de equivalência).

Em termos genéricos, este princípio de equivalência implica que o operador com PMS deve seguir os mesmos processos e procedimentos quer para satisfazer as suas necessidades internas, as dos seus próprios serviços e das empresas subsidiárias, quer para satisfazer os pedidos das restantes entidades. Caso contrário, encontrar-se-ia numa situação de vantagem concorrencial face aos outros operadores. Sem prejuízo para as medidas incluídas nesta decisão, analisar-se-á, posteriormente, à luz da citada Recomendação, o princípio da equivalência de acesso em maior profundidade.

Também o ICP-ANACOM, no relatório da consulta pública sobre a abordagem regulatória às NRA, aprovado por deliberação de 18.02.2009 7, reconheceu a importância do acesso às condutas da PTC, como meio privilegiado de promoção dos investimentos por parte dos operadores alternativos em rede própria ao reduzir a principal componente de custo na implementação das NRA - os trabalhos de construção civil 8 para instalação de redes de fibra óptica. No mesmo relatório o ICP-ANACOM informou ir proceder a uma análise aprofundada das matérias relativas à ORAC incluindo as questões e propostas apresentadas nas respostas à consulta pública, sendo a presente deliberação a via adequada para o efeito.

Considerando a importância acrescida da ORAC, oferta esta que decorre da obrigação imposta ao abrigo do artigo 26.º da Lei n.º 5/2004 de 10 de Fevereiro e que foi identificada como obrigação na sequência da análise dos mercados 4 e 5, e o facto de esta oferta ter sido definida já há alguns anos e de entretanto terem chegado ao ICP-ANACOM vários contributos e sugestões de alteração 9, entendeu-se adequado proceder a alterações da sua formulação.

Assim, por deliberação de 17.11.2009 10, foi aprovado o sentido provável de decisão sobre as alterações à ORAC, bem como a sua submissão a audiência prévia das entidades interessadas, nos termos dos artigos 100.º e 101.º do Código de Procedimento Administrativo, e ao procedimento geral de consulta, previsto no artigo 8.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, fixando-se para ambos o prazo máximo de 30 dias úteis.

Os comentários recebidos foram objecto de análise no relatório da audiência prévia e da consulta pública sobre o sentido provável da decisão relativa às alterações à ORAC, o qual faz parte integrante da presente deliberação.

Foi igualmente aprovada a notificação a remeter à CE e às autoridades reguladoras nacionais dos restantes Estados-Membros, nos termos do n.º 1 do artigo 57.º da mesma Lei n.º 5/2004, tendo a CE comunicado não ter quaisquer observações a apresentar sobre o projecto que lhe foi apresentado.

Notas
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1 Sem prejuízo da possibilidade de os operadores poderem recorrer à utilização de condutas de outras entidades que poderão complementar, em determinadas zonas, o acesso à rede de condutas da PTC.
2 Broadband: Commission consults on regulatory strategy to promote high-speed Next Generation Access networks in Europehttp://europa.eu/rapid/pressReleasesAction.do?reference=IP/08/1370&format=HTML&aged=0&language=EN&guiLanguage=en.
3 Draft Commission Recommendation of […] on regulated access to Next Generation Access Networks (NGA)http://ec.europa.eu/information_society/policy/ecomm/doc/library/public_consult/nga_2/090611_nga_recommendation_spc.pdf.
4 Vide BEREC Opinion to the Draft Recommendation on regulated access to Next Generation Access Networks (NGA) of 28 April 2010http://berec.europa.eu/doc/berec/bor_10_25.pdf.
5 Vide Recommendations and Guidelineshttp://ec.europa.eu/information_society/policy/ecomm/library/recomm_guidelines/index_en.htm.
6 O princípio de equivalência encontra-se detalhado no Anexo II da recomendação.
7 Abordagem regulatória às novas redes de acesso - consulta encerradahttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=849069.
8 Por exemplo, construção de valas, instalação de condutas e caixas de visita.
9 Contributos remetidos ao ICP-ANACOM no âmbito da consulta pública sobre a abordagem regulatória às NRA e que continha uma questão específica sobre sugestões de melhoria na ORAC, sem prejuízo de outros (contributos) que também foram remetidos a esta Autoridade posteriormente a essa consulta.
10 Vide PDF Sentido Provável de Decisão do ICP-ANACOM: Alterações à Oferta de Referência de Acesso a Condutas (ORAC).