10.2. Eventuais distorções concorrenciais que podem resultar das vantagens técnicas associadas a algumas faixas de frequências


Conforme referido no ponto anterior, o Leilão Multifaixa poderia ter terminado com resultados muito diferenciados para as entidades participantes. Nesse caso seria fundamental aferir em que medida as vantagens técnicas associadas a determinadas faixas de frequências teriam potencial para criar distorções concorrenciais, quer pelo impacto que essas vantagens pudessem ter sobre os utilizadores finais, designadamente se estes percecionassem diferenças a nível da qualidade de serviço decorrentes da utilização de diferentes faixas de frequências (por exemplo a nível da velocidade disponível), quer pelo impacto nos concorrentes quer pelos benefícios em termos de eficiência produtiva decorrentes da utilização de determinadas faixas de frequências em detrimento de outras.

Nota-se em todo caso que, ainda que existissem entidades com pacotes de espectro muito diferentes, por exemplo entidades sem espectro na faixa de frequências dos 900 MHz, tal não significaria necessariamente que as desvantagens dessa situação não pudessem ser ultrapassadas, quer pelo recurso a outras faixas de frequências ou a soluções alternativas com vista ao reforço da cobertura, sem que tal se viesse a traduzir numa desvantagem competitiva importante que justificasse uma intervenção regulatória. Neste contexto, recorda-se que foi explicitamente previsto no Regulamento do Leilão que os operadores que obtivessem espectro nos 800 MHz e/ou 900 MHz, teriam uma obrigação de aceitar acordos de itinerância nacional com terceiros que possuíssem direitos de utilização de frequências nas faixas acima de 1 GHz e que não possuíssem direitos de utilização de frequências sobre mais do que um total de 2 x 5 MHz cumulativamente nas faixas dos 800 MHz e 900 MHz.

Neste âmbito, importa salientar alguns aspetos que são fulcrais na análise da situação existente em Portugal:

a)    Os operadores de rede móvel antes do Leilão Multifaixa tinham praticamente a mesma quantidade de espectro, sendo que todos tinham espectro na faixa dos 900 MHz, dos 1800 MHz e dos 2,1 GHz;

b)    O refarming da faixa de frequências dos 900 MHz abrangeu de igual forma os três operadores de rede móvel;

c)    Em resultado do Leilão Multifaixa, os três operadores de rede móvel obtiveram uma quantidade de espectro muito aproximada (conforme se pode constatar pela informação constante da Tabela 3) e no final mantiveram uma quase simetria de espectro (conforme se verifica na Tabela 4).

Em relação a este último ponto, releva-se que o leilão foi desenhado de forma a permitir que cada interessado pudesse adquirir uma combinação de espectro com vista a assegurar soluções completas de capacidade/cobertura. Neste contexto, os operadores de rede móvel que se encontravam em atividade à data da realização do Leilão Multifaixa fizeram uma análise de custo/benefício e optaram por um pacote de frequências muito aproximado.

Ainda que a Vodafone tenha vindo a adquirir espectro adicional na faixa dos 900 MHz, não tendo sido essa a opção dos outros operadores móveis, que não licitaram esse espectro, os benefícios que essa faixa possa representar em termos de eficiência produtiva, serão praticamente eliminados ou mesmo inexistentes quando se verifica que todos os operadores têm um pacote de frequências muito semelhante, nomeadamente a nível das restantes faixas de frequências. Acresce que há naturalmente uma racionalidade económica na decisão de não licitação do espectro relativo aos 900 MHz por parte dos outros operadores, que terão ponderado custos e benefícios dessa decisão, e terão concluído que não seria por não adquirirem esse espectro que seriam colocados em situação de desvantagem competitiva. Aliás, o facto de ter sobrado espectro nesta faixa de frequências constitui uma prova de que houve margem para outras decisões, que no entanto não foram adotadas. Adicionalmente, também é relevante neste contexto, o facto de a Vodafone ter de transmitir a outra entidade ou devolver ao ICP?ANACOM 2 x 3 MHz (nos 800/900 MHz) a partir de 30 de junho de 2015 e no prazo de 6 meses após essa data, pelo que qualquer vantagem que se pudesse alegar que a aquisição de espectro adicional nos 900 MHz lhe tivesse trazido seria eliminada a curto/médio prazo.

A Vodafone também adquiriu 25 MHz TDD na faixa dos 2,6 GHz, espectro que mais nenhum operador licitou, eventualmente porque não foi considerado essencial para o desenvolvimento do negócio dos outros operadores, salientando-se ainda que ficaram por atribuir outros 25 MHz TDD na mesma faixa de frequências.

Pode concluir-se assim que não existem quaisquer evidências de que o tipo e quantidade de espectro alocado aos três operadores de rede móvel em Portugal possam criar alguma distorção concorrencial no mercado móvel.

A tabela seguinte mostra a quantidade de espectro adquirida em resultado do Leilão Multifaixa, bem como o preço final pago pelos operadores pelo espectro em causa.

Tabela 7 - Espectro atribuído no Leilão Multifaixa e preço total pago

Operador

Denominação da Faixa

Quantidade de espectro atribuído

Preço Total Pago

MEO

800 MHz

2 x 10 MHz

90 M€

1800 MHz

2 x 14 MHz

11 M€

2,6 GHz FDD

2 x 20 MHz

12 M€

Optimus

800 MHz

2 x 10 MHz

90 M€

1800 MHz

2 x 14 MHz

11 M€

2,6 GHz FDD

2 x 20 MHz

12 M€

Vodafone

800 MHz

2 x 10 MHz

90 M€

900 MHz

2 x 5 MHz

30 M€

1800 MHz

2 x 14 MHz

11 M€

2,6 GHz FDD

2 x 20 MHz

12 M€

2,6 GHz TDD

25 MHz

3 M€

 

Neste contexto, poderia haver uma situação em que apesar de todos os operadores terem quantidades de espectro equivalentes, o custo que cada um teve de pagar pelos direitos de utilização desse espectro pudesse ser muito diferenciado, potenciando eventuais distorções na concorrência.

No entanto, ainda que tal tivesse acontecido, também se poderia argumentar que cada entidade licitou (e pagou) até ao ponto em que considerou que os custos não ultrapassavam as vantagens que antecipava viria a ter com o espectro em causa.

Nota-se em todo o caso que não se verificaram diferenças nos valores finais do espectro nas diversas faixas de frequências, pelo que a questão é meramente teórica.

Face ao exposto, o ICP-ANACOM considera que o espectro sobre o qual os três operadores de rede móvel em Portugal detêm direitos de utilização não representa para nenhum dos operadores em causa uma vantagem competitiva que possa resultar na criação ou desenvolvimento de distorções competitivas no mercado móvel. Como tal, o ICP-ANACOM considera que não há justificação para qualquer intervenção regulatória.