Relatório da audiência prévia às entidades interessadas sobre o sentido provável da decisão
1. ENQUADRAMENTO
Por Deliberação de 19 de Junho de 2003, o Conselho de Administração da ANACOM aprovou, nos termos e ao abrigo da alínea a) do n.º 2 e do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento (CE) n.º 2887/00 do Parlamento Europeu e do Conselho, proceder à audiência prévia das partes interessadas1, de acordo com o fixado nos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo, sobre a Deliberação que pretende tomar com o seguinte conteúdo2:
Tendo em conta a necessidade de simplificar o processo relativo ao acesso partilhado e de promover uma solução economicamente mais eficiente, deve a PT Comunicações alterar a ORALL no prazo de 10 dias, no sentido de serem os OOLs a proceder à instalação do splitter, podendo o mesmo ser integrado no DSLAM.
A PT Comunicações ligará, caso seja necessário, através de cabo interno ou externo, o repartidor intermédio ao repartidor de ''handover'' (HDF), bem como o retorno, do repartidor de ''handover'' ao repartidor intermédio.
No âmbito da audiência prévia foram recebidos comentários da Novis Telecom, S.A.3 (adiante designada Novis), da OniTelecom - Infocomunicações, S.A.4 (adiante designada Oni) e da PT Comunicações, S.A.5 (adiante designada PTC).
2. RESPOSTAS DOS INTERESSADOS À AUDIÊNCIA PRÉVIA
A Novis reitera as posições anteriormente expressas, salientando que a evolução tecnológica dos equipamentos utilizados para a desagregação do lacete local permite que o outro operador licenciado (OOL) possa ser auto-suficiente neste particular e refere a necessidade de adoptar soluções que permitam uma efectiva e substancial redução dos custos.
A Oni considera a opção de instalação dos splitters pelos OOLs naturalmente correcta, apoiando a deliberação que a ANACOM pretende tomar, em particular se tal deliberação se reflectir numa redução dos custos incorridos.
Em particular, a Oni refere que a opção constante do Sentido Provável da Deliberação, apesar de obrigar à duplicação dos pares necessários na ligação interna (e no HDF) no que respeita aos lacetes desagregados naquele regime de acesso, permite que os OOLs aufiram de economias de escala e de gama relevantes - que se repercutem em reduções dos custos incorridos pelos OOLs - e simplifica, em termos globais, todo o processo logístico associado ao acesso partilhado. Este ultimo entendimento é corroborado pela Novis.
A Oni assinala que a PTC deve publicar de imediato as alterações ao respectivo formulário de pedido de lacete partilhado, no sentido de serem indicadas pelo OOL duas posições de HDF por cada acesso partilhado, devidamente identificadas.
A Novis considera que, para uma dada central, a aplicação da solução preconizada pela ANACOM não deverá ser colocada em causa pelo facto de um outro OOL recorrer ao serviço em que o splitter é da responsabilidade da PTC.
A PTC considera que a solução técnica a adoptar na implementação do acesso partilhado é a actual, em que o operador notificado instala os seus próprios splitters para separar as frequências destinadas às comunicações de voz das que suportam serviços de mais elevado débito. Segundo a PTC, tal entendimento resulta da definição de acesso partilhado adoptada tanto pela Comissão Europeia como pela própria ANACOM.
Ainda segundo a PTC, a solução proposta pela ANACOM apresenta problemas de natureza técnica que poderão comprometer a prestação do serviço fixo de telefone (SFT) aos níveis exigidos em termos regulamentares ao prestador de serviço universal. Assim, entende que deve ser salvaguardada a primazia da solução técnica actual, devendo qualquer outra solução merecer o seu acordo.
Especificamente, os comentários da PTC, incidem sobre quatro aspectos particulares, a saber: (i) a segurança da rede básica e inviolabilidade das comunicações; (ii) a interoperabilidade do SFT; (iii) a manutenção dos níveis de serviço e a responsabilidade do OOL na degradação do serviço; e (iv) a necessidade de alteração do contrato de prestação do SFT.
Em relação ao primeiro aspecto, a PTC refere que a solução apresentada não salvaguarda devidamente a inviolabilidade das comunicações, uma vez que as frequências de suporte à telefonia vocal, que os OOLs devolvem à PTC, são um sinal interceptável ou violável6.
No tocante ao segundo ponto, a PTC entende que a solução em discussão não garante a continuidade da prestação do SFT. Com efeito, segundo a PTC, não é possível garantir o correcto interfuncionamento dos splitters do OOL com a rede da PTC (SFT e RDIS), uma vez que o splitter instalado pelo OOL pode apresentar deficiências de operação, sendo necessário testá-lo quanto à sua compatibilidade com os serviços SFT e RDIS, por forma a garantir que o mesmo não provoca degradações ou inviabiliza a continuidade da prestação dos referidos serviços.
Em relação às condições de prestação do SFT e manutenção dos níveis de serviço, a PTC refere que não se encontram garantidas as condições de despiste e de reparação de avarias. De acordo com a PTC, não é possível resolver anomalias e/ou avarias no equipamento de filtragem, pertencente ao OOL, dentro dos prazos a que a PTC está obrigada, nem a responder eficazmente às reclamações dos clientes. Assim, a PTC considera existirem riscos evidentes de degradação da prestação do serviço universal que os OOLs não quererão assumir.
Finalmente, a PTC entende que a solução proposta pela ANACOM implica uma alteração do contrato de prestação do SFT dado ser necessária uma declaração do cliente final onde este expresse claramente que tem conhecimento da existência de uma terceira entidade envolvida na prestação do serviço e que aceita todas as implicações daí decorrentes.
Tendo em conta o disposto no Sentido Provável da Deliberação e os comentários efectuados pelos interessados, a ANACOM entende que:
1. A PTC deve alterar o formulário de pedido de lacete partilhado, no sentido de poder serem indicadas pelo OOL as duas posições de HDF por cada acesso partilhado, devendo existir para cada uma das posições uma designação adequada.
2. Sendo desejável uma simplificação dos processos logísticos e de aprovisionamento, e atendendo ao facto de não existir actualmente em Portugal desagregação de acessos partilhados, por ausência de procura dos interessados, não existem razões para manter a obrigatoriedade da opção prevista no Sentido Provável da Deliberação em coexistência com a anterior solução, dado poder resultar num ónus excessivo para a PTC.
Note-se, aliás, que a opção prevista no Sentido Provável da Deliberação foi considerada, pelos beneficiários interessados, melhor adequada aos respectivos interesses.
3. Tanto a solução técnica agora em discussão como a solução técnica actualmente definida na ORALL para a implementação do acesso partilhado são compatíveis com a definição de acesso partilhado prevista no Regulamento (CE) n.º 2887/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho7.
A este respeito, e tal como referido no ''relatório da audiência prévia sobre o sentido provável da deliberação relativa a alterações a introduzir na PRI e na ORALL'', a nível comunitário foram adoptadas quer a solução actualmente prevista na ORALL, quer a solução agora em discussão.
4. Tal como previsto na legislação em vigor8, quer a PTC, quer o OOL, no exercício das respectivas actividades (enquanto operadores de redes públicas de telecomunicações e enquanto prestadores de serviços de telecomunicações) estão obrigados a assegurar a confidencialidade das comunicações, pelo que a solução em análise não põe em causa a salvaguarda da inviolabilidade das comunicações.
Assim, no caso em que o splitter é da responsabilidade do OOL, cabe a este operador garantir a extensão da inviolabilidade das comunicações a este equipamento. Aliás, uma situação semelhante se passa nas comunicações inter-redes em que todas as partes devem assegurar e fazer respeitar o sigilo das comunicações nos elementos de rede da sua responsabilidade.
5. Caso os equipamentos dos OOLs sigam as normas técnicas em vigor9 e sejam efectuados testes de compatibilidade entre os splitters do OOL e o equipamento da PTC - nomeadamente com o sistema automático de ensaio de linha -, não existem razões para não adoptar a solução técnica prevista no Sentido Provável da Deliberação.
Para uma maior certeza e transparência do processo poderá, eventualmente, uma lista de equipamentos testados e compatíveis ser anexada à ORALL.
6. A PTC deve assegurar tempestivamente a reparação das infra-estruturas, materiais e equipamentos de sua propriedade utilizados na prestação do serviço, não devendo, assim, ser contabilizados, para efeitos de resolução de avarias, prazos que não lhe sejam directamente imputáveis.
É natural que, tal como actualmente se encontra previsto, a PTC não seja obrigada a assegurar a reparação de elementos que não são da sua propriedade e responsabilidade. Assim, o OOL deve ser o único responsável pelo bom funcionamento e operacionalidade do splitter.
Em caso de detecção de anomalia ao nível do splitter, quer por parte da PTC quer por parte do OOL, que afecte o SFT, deve o OOL proceder à sua resolução no prazo mais curto possível, devendo ser estabelecido um processo expedito de troca da informação entre a PTC e os OOLs necessária para a célere resolução da avaria. Deve também ser garantido o mesmo tipo de ensaios de linha e a respectiva fiabilidade de resultados que actualmente é assegurado pela PTC.
7. Não existe necessidade de alterar o contrato de prestação do SFT, sendo que já no quadro actual o assinante autoriza previamente o processo de desagregação do lacete na modalidade de acesso partilhado10, sendo necessariamente informado pelo OOL das implicações da opção por esta modalidade de acesso.
A ORALL contém já um extenso conjunto de salvaguardas que isentam a PTC de responsabilidades por eventuais incumprimentos, imputáveis aos OOLs, das suas obrigações face aos assinantes11. No mesmo sentido, deve ser mantida a lógica conceptual adoptada na ORALL, isto é, a aplicabilidade das regras gerais da responsabilidade civil, mediante as quais a PTC é responsável perante os seus assinantes, assistindo-lhe um direito de regresso face ao OOL, caso se apure a responsabilidade deste último no incumprimento verificado.
Por último, como referido no ''relatório da audiência prévia sobre o sentido provável da deliberação relativa a alterações a introduzir na PRI e na ORALL'', vários Estados-Membros12 adoptaram a solução técnica prevista no Sentido Provável da Deliberação, o que confirma que eventuais questões técnicas, ou outras, que possam existir, podem ser ultrapassadas.
Em conclusão, a ANACOM entende ser de manter, na generalidade, o disposto no Sentido Provável da Deliberação.
1 Tendo sido concedido um prazo de 10 dias.
2 Adiante designado ''Sentido Provável da Deliberação''.
3 Carta datada de 07.07.03. A Novis salienta que a exposição realizada nas comunicações de 15.04.03 e de 13.05.03 deve ser entendida como a posição da Novis nesta matéria.
4 Fax datado de 09.07.03.
5 Carta datada de 14.07.03.
6 A este respeito a PTC refere a norma ETSI TS 101 952.
7 Definido como ''a oferta a um beneficiário de acesso ao lacete local ou ao sub-lacete local do operador notificado, com direito de utilização do espectro de frequências não vocais do par de condutores metálicos entrançados; o lacete local continua a ser utilizado pelo operador notificado para fornecer o serviço telefónico ao público''.
8 O Quadro regulamentar sectorial dispõe de um conjunto de obrigações que visam assegurar o sigilo das comunicações, as quais são aplicáveis a ambas as partes envolvidas no processo. Salientam-se as disposições contidas na Lei n.º 91/97 (artigo 17.º, n.º 2), Lei n.º 69/98 (artigo 5.º, n.º 1 e n.º 2), Decreto-Lei n.º 381-A/97 (artigos 7.º, n.º 1 alínea e) e 11.º, n.º 1, alínea c), Decreto-Lei n.º 415/98 (artigo 24.º), Decreto-Lei n.º 290-A/99 (artigo 3.º, n.º 2, alínea d), Decreto-Lei n.º 474/99 (artigo 6.º) e Decreto-Lei n.º 290-B/99 (artigo 4.º, n.º 3, alínea e).
9 Nomeadamente a norma ETSI TS 101 952.
10 Segundo a actual formulação da ORALL, por exemplo, no seu ponto 4.1.2, o assinante terá que ''manifestar, de forma clara e inequívoca e em documento devidamente assinado, a sua pretensão junto da PT Comunicações'', para que a implementação do processo associado ao acesso partilhado tenha início.
11 A título indicativo, vejam-se os seguintes capítulos constantes da ORALL: 4.1.1 - Acesso Completo, 4.1.2 - Acesso Partilhado, 5.1 -Equipamento Terminal de Telecomunicações, 5.2 - Equipamento co-instalado em edifícios da PTC, 7.2 - Condições de fornecimento, 14 - Segurança e protecção e 18 - Interrupção e suspensão do serviço.
12 Nomeadamente, a Áustria, a Dinamarca, a Finlândia, a Holanda, a Irlanda, a Itália, o Reino Unido e a Suécia.