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Deliberação de 12.07.2007
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1. Introdução
A 31 de Outubro de 1999 foi introduzido um formato uniforme e fechado no Plano Nacional de Numeração (PNN) fixando uma estrutura a 9 dígitos, o que, no caso dos números móveis, alterou o código atribuído a cada operador de 3 para 2 dígitos, com a supressão do dígito intermédio. Esta mudança possibilitou uma capacidade disponível de numeração para cada operador de 10 milhões de números.
Esta situação de recursos abrigados em três únicas gamas de dois dígitos, uma para cada operador de serviço telefónico móvel, condicionou o mercado em geral ao efeito de uma correlação biunívoca entre código - 91, 93, 96 - e operador móvel - Vodafone, Optimus, TMN. De facto, quer o ICP-ANACOM na emissão dos primeiros títulos de licenças GSM, quer os operadores através das suas campanhas comerciais, quer ainda os utilizadores em resultado dessas próprias campanhas e do diferencial nas tarifas entre chamadas on-net e off-net, fortaleceram essa ligação do código ao operador. Só mais tarde, em Janeiro de 2002, a introdução da portabilidade de operador nas redes móveis se encarregaria de começar a eliminar tal percepção, embora de forma bastante incipiente, dado o baixo nível de números portados registado no serviço telefónico móvel.
Neste quadro, o ICP-ANACOM, quando recentemente recebeu um pedido de um operador do serviço telefónico móvel para a atribuição de direitos adicionais de utilização de números móveis, considerou que deveria dar conta da análise que efectuou no âmbito da sua responsabilidade de gestão do PNN, o que é objecto do presente documento.
2. O Pedido
A 26 de Abril de 2007, a TMN - Telecomunicações Móveis Nacionais, S.A. (TMN) apresentou ao ICP-ANACOM um pedido de atribuição de direitos de utilização de novos blocos de 10.000 números para o serviço telefónico móvel, afirmando ter já uma taxa de ocupação de números atribuídos a clientes activos superior a 60% do total de recursos atribuídos. A TMN acompanhou o seu pedido com o levantamento do estado dos recursos de que dispõe.
Na base dos ''Princípios e critérios para a gestão e atribuição de recursos de numeração'', ''Um pedido de atribuição de números poderá ser recusado se não se atingiu 60% de utilização da capacidade de atribuições anteriores ao mesmo requerente
''. Considera-se que uma taxa de utilização superior a 60% constitui condição de aceitação para o pedido de atribuição. Tem sido esta, aliás, a prática do ICP-ANACOM e por isso o pedido da TMN encontra-se em condições de ser satisfeito, dada a ocupação dos números que lhe estão atribuídos. Ao ICP-ANACOM cabe a responsabilidade de actuar no âmbito das suas competências definidas na LCE, satisfazendo os pedidos nestas condições na base de critérios de racionalidade, proporcionalidade e eficácia, de acordo com o estabelecido, nomeadamente, nos seus artigos 17.º, 33.º, 34.º e 35.º.
É útil, contudo, que o enquadramento desta solicitação da TMN seja feito de forma aberta e transparente, apesar de apenas requerer do ICP-ANACOM um mero acto administrativo de gestão do PNN, por se não tratar de uma medida com impacte significativo no mercado relevante, não exigindo por isso procedimento geral de consulta previsto no Artigo 8.º da Lei 5/2004, de 10 de Fevereiro (LCE). É assim de interesse que a posição do ICP-ANACOM nesta matéria e a respectiva fundamentação, estribada na LCE e nos princípios que têm norteado a actuação do ICP-ANACOM na atribuição de direitos de utilização de números, sejam do conhecimento de todo o mercado, e em particular, das empresas em condições de disporem, elas próprias, de direitos de utilização de números do PNN.
3. Análise
No PNN (E.164) estão alojados serviços, cujos códigos de 1, 2, ou 3 dígitos têm um efeito indiciador do serviço em causa. É assim que, por exemplo, o ''2'' corresponde ao serviço telefónico em local fixo, o ''30'' ao serviço VoIP nómada, o ''800'' ao serviço de chamada grátis para o chamador e o ''9'' ao serviço móvel, incluindo, neste último caso, todos os serviços móveis que precisem de recursos de numeração como meio para assegurar a interoperabilidade entre utilizadores. Exceptuando o caso do serviço telefónico em local fixo que ainda recorre a discriminação em 51 áreas geográficas de Portugal identificadas num campo intermédio na estrutura dos números do nível ''2'', para os restantes serviços, os dígitos que se seguem fornecem uma capacidade de numeração que é directa e imediatamente susceptível de ser distribuída pelo ICP-ANACOM aos prestadores habilitados a receberem os respectivos direitos de utilização.
Efectivamente, conforme o que está publicado no site do ICP-ANACOM sobre o PNN, observa-se que este prevê em dois dos seus elementos informativos que:
(i) O nível ''9'' é dedicado a Serviços de Comunicações Móveis1, identificando-se os códigos específicos ''91'', ''93'' e ''96'' para o Serviço Móvel Terrestre.
(ii) As atribuições primárias de números, quer geográficos quer específicos de serviços, são feitas em blocos de 10.000 números2.
Ou seja, os códigos ''91'', ''93'' e ''96'' estão integrados num nível dedicado, em primeiro lugar, a serviços móveis - ''9'' -, e só depois são designados para o actualmente chamado serviço telefónico móvel, sendo que os 1.000 blocos de 10.000 números de cada um decorrem das respectivas licenças, anteriores ao próprio PNN, e da estrutura por ele implementada em 1999. Conceptualmente, o mecanismo é o mesmo que aquele que é aplicado a outros serviços - identificação do código e correspondente serviço no PNN e depois, atribuição da capacidade disponível no quadro dos critérios estabelecidos. Por razões mais históricas do que de outra natureza, associadas em particular à metodologia seguida na reestruturação do PNN, não tem sido necessário proceder à atribuição de direitos de utilização de números móveis como sucede, por exemplo, com a atribuição que amiúde se faz de direitos de utilização de números geográficos ou nómadas. Trata-se, contudo, de uma especificidade portuguesa. Tipicamente, nos outros países europeus, os reguladores atribuem também direitos de utilização de números móveis em agrupamentos de 1, 10 ou 100 blocos de 10.000 números e não de uma única vez. Com tal prática observam uma gestão mais fina de recursos, com o consequente ganho de eficácia na sua utilização, e evitam, em alguns casos3, a correlação automática entre os primeiros dígitos dos números e o operador, adiantando o que a própria portabilidade se encarregou de realizar como atrás referido, com benefícios para o mercado.
Deste modo não fará sentido no momento actual continuar a atribuir gamas de 10 milhões de números a um único operador, o que representaria um excesso manifesto face às necessidades e configuraria uma utilização ineficiente de recursos de numeração - por isso contrariando o definido na LCE - com consequências fortemente negativas na sustentabilidade a médio e longo prazo do actual PNN.
Esgotada a numeração nas gamas ''91'', ''93'' e ''96'' em atribuições de direitos já efectuadas, só poderia ser nas gamas adjacentes disponíveis que faria sentido o ICP-ANACOM encontrar a reserva necessária de numeração. Definido que foi o nível ''9'' para serviços de comunicações móveis, o processo de abertura de uma nova gama não difere do processo corrente de atribuição adicional de direitos de utilização dos números de um novo bloco a uma empresa que já utilizou 60% dos números cujos direitos lhe tinham sido atribuídos para o mesmo efeito. O acto de destinar gamas adjacentes, uma a uma, para o serviço telefónico móvel é assim um acto de mera gestão do PNN, que ao abrigo do artigo 17.º, 2.º, b), da LCE, é uma competência do ICP-ANACOM.
Por outro lado, a neutralidade tecnológica do PNN (E.164) e o propósito deste em providenciar o acesso a serviços sem dar relevo a redes ou sistemas específicos ou a prestadores com características especificas, esteve na base da posição do ICP-ANACOM de 9 de Fevereiro de 2007, sobre o enquadramento regulatório da actividade dos MVNO . Nesta posição o ICP-ANACOM apenas considerou determinante para a atribuição de direitos de utilização de números ''9'', a oferta de serviço telefónico móvel, independentemente do modelo de negócio escolhido pelo MVNO4 - ''puro'' ou light. Este modelo pode, assim, restringir-se a uma mera oferta retalhista sem envolver a instalação e operação de meios próprios - redes ou sistemas - no estabelecimento das comunicações. Basta, portanto, a existência de oferta de serviço telefónico móvel enquanto produto comercial próprio e autónomo para haver lugar à atribuição de direitos de utilização de números ''9''.
Nestas condições, existindo necessidade de numeração por parte das empresas que prestam serviços telefónicos móveis, quer as actualmente já presentes no mercado, quer outras que venham a instalar-se, e esgotada que está a capacidade dos ''códigos'' de serviço ''91'', ''93'', e ''96'', disponíveis, há que optar entre os restantes (''92'', ''95'', ''97'', ''98'', ''99'' e ''90'') para a mesma finalidade. De notar que a gama ''94'' já acomoda códigos para o serviço móvel de recursos partilhados e para o serviço móvel marítimo.
A opção do ICP-ANACOM vai para o código ''92'', por uma simples questão de sequência e homogeneidade. A gama ''92'' foi já expressa pelo ICP-ANACOM no referido enquadramento dos MVNO, para iniciar a atribuição de direitos neste domínio5. E sendo naturalmente esta gama destinada a serviços telefónicos móveis, é indiferente que nela sejam atribuídos direitos a MVNOs ou a MNOs. Tendo presente novamente o artigo 17.º da LCE, n.º 1 e alíneas b) e c) do n.º 2, deve o ICP-ANACOM garantir, não só a ''disponibilidade de recursos de numeração adequados para todas as redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público
'', como ainda a atribuição dos mesmos através de ''procedimentos objectivos, transparentes e não discriminatórios
''.
Sem prejuízo do que acima foi dito, considera-se que pode haver algum impacto nos utilizadores decorrente desta opção. Apesar de a portabilidade de operador ter desencadeado um processo de aprendizagem dos utilizadores no sentido de não manterem a identificação inequívoca dos operadores com base no número, esse processo está longe de estar consolidado. De facto, a portabilidade aplicada aos números móveis tem uma penetração muito pouco expressiva e por isso o efeito da relação operador-número ainda se faz sentir de forma muito marcada.
A atribuição de números começados por ''92'' aos operadores já instalados no mercado - como é agora o caso da TMN - vem antecipar, com relevância acrescida, uma questão já identificada aquando da definição desta gama para os MVNOs: a partilha da gama ''92'' por diversos operadores colocará problemas adicionais à identificação, pelos utilizadores de chamadas off-net, que, como se sabe e em muitas situações, apresentam tarifas várias vezes superiores às chamadas on-net.
Como é sabido, o diferencial de preço entre chamadas on-net e off-net no serviço móvel terrestre, levou a uma intervenção do ICP-ANACOM aquando da implementação da portabilidade neste mercado, no sentido de impor a disponibilização de uma mensagem que identificasse a ocorrência de chamadas que, por passarem a ser off-net teriam uma tarifa imprevisivelmente muito mais elevada (mensagem prevista no artigo 21.º do Regulamento 58/2005)6https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55134. Tal mensagem não tem no entanto aqui aplicação (dado que o número não é portado), deixando por isso os consumidores sem informação sobre se estão a realizar uma chamada on-net ou off-net, dado que o número de destino 92 das suas chamadas tanto pode ser cliente da sua rede, como de outro MNO ou MVNO.
Esta questão está obviamente ligada ao problema mais genérico do enorme diferencial entre os preços on-net e off-net que caracteriza o mercado português de comunicações móveis, colocando uma pressão adicional na sua diminuição.
O ICP-ANACOM permanecerá atento a esta problemática e tê-la-á em conta, nomeadamente, na eventual necessidade de alargamento do âmbito da mensagem actualmente disponibilizada no domínio da portabilidade, caso não se verifique alteração significativa no referido diferencial de preço entre chamadas on-net e off-net. É no entanto assunto que merece reflexão adicional, envolvendo consulta ao mercado, por forma a decidir da necessidade e dimensão de medidas destinadas a aumentar a transparência para o utilizador das chamadas abrangidas por uma e outra situações.
4. Conclusão
Concluindo, a análise do ICP-ANACOM é de que a extensão da capacidade de numeração para o serviço telefónico móvel em gamas adjacentes disponíveis já previstas no PNN para serviços móveis é um acto de gestão do PNN.
O regime de neutralidade e de gestão transparente e eficaz a que o PNN está sujeito, determina que, da gama ''92'', a ser designada para o serviço telefónico móvel, sejam atribuídos blocos a todos os prestadores habilitados para oferecer este serviço, segundo os mesmos critérios de igualdade, não discriminação e proporcionalidade.
São também critérios de proporcionalidade e de utilização eficaz de recursos que estão na base da aplicação de taxas de utilização de números como determina o artigo 105.º da LCE e que serão proximamente implementadas. É pois do interesse também dos próprios operadores que os direitos de utilização de números lhes sejam atribuídos de acordo com as efectivas necessidades de numeração.
Por último, a ICP-ANACOM considera que esta actualização do PNN, que como as demais é sempre publicada no seu sítio, seja também explicada de uma forma aberta e transparente ao mercado em geral, para o que se preparou este documento de enquadramento.