C. Decisão


Relativamente à existência de um direito da Radiomóvel à interligação.

Nos termos do artigo 22.º da LCE, «[c]onstituem direitos das empresas que oferecem redes ou serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público: a) Negociar a interligação e obter o acesso ou a interligação de outras empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, nas condições e nos termos previstos na presente lei».

O artigo 62.º da LCE reconhece às empresas liberdade de negociação permitindo que as empresas negoceiem e acordem entre si modalidades técnicas e comerciais de acesso e interligação e o artigo 64.º, n.º 2 da LCE, estabelece que os «…operadores têm o direito e, quando solicitados por outros, a obrigação de negociar a interligação entre si com vista à prestação de serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, por forma a garantir a oferta e a interoperabilidade de serviços» 1.

De entre as condições associadas ao Direito de Utilização de Frequências ICP-ANACOM n.º 5/2008 conta-se a de «[n]egociar e obter o acesso ou a interligação de outras empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, nas condições e nos termos previstos na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, sem prejuízo das competências da Autoridade Reguladora Nacional previstas na lei, nomeadamente no âmbito da análise de mercados».

Das disposições acima indicadas resulta, inequivocamente, que a Radiomóvel tem o direito e as demais empresas chamadas a intervir no presente processo, a obrigação de negociarem interligação entre si, de forma a garantir a oferta e interoperabilidade dos serviços. Por outro lado, no termo das análises de mercado realizadas, a PTC, a Sonaecom, a TMN e a Vodafone foram declaradas com poder de mercado significativo (PMS). A Sonaecom, a TMN e a Vodafone no mercado grossista de terminação de chamadas vocais em redes móveis individuais e o Grupo PT bem como as três empresas já acima referidas, no mercado grossista de terminação de chamadas em redes telefónicas públicas num local fixo. Da declaração de PMS decorre para as referidas empresas, nos termos do que foi fixado pelo ICP-ANACOM, a obrigação de dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso que lhe sejam deduzidos para a terminação de chamadas originadas na rede móvel da Radiomóvel.

Do acima exposto resulta que a Radiomóvel tem o direito de obter o acesso à rede da PTC, da Sonaecom, da TMN e da Vodafone e estas empresas a obrigação de facultar aquele acesso nos termos em que a interligação é disponibilizada a outras entidades e no respeito das obrigações impostas no âmbito dos procedimentos de análise de mercado, observando, em particular, as obrigações de dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso e de não discriminação.

Muito embora a lei não fixe um prazo para que as empresas cheguem a um acordo de interligação, a boa fé que nas negociações e na celebração dos contratos é exigida às partes (artigo 227.º do Código Civil), não é compatível com a eternização do processo negocial que antecede a celebração dos acordos de interligação.

Assim, no âmbito do presente processo, justifica-se fixar um prazo para comunicação à ANACOM dos acordos de interligação celebrados. Tomando por referência os procedimentos previstos na Oferta de Referência de Interligação (ORI) a que a PTC está sujeita, considera-se razoável determinar às empresas envolvidas, a obrigação de comunicar à ANACOM a celebração dos acordos de interligação, no prazo máximo de 90 dias (de calendário) a contar da data da decisão final que vier a ser proferida (vd. ponto 12 da ORI e anexo 4 da mesma Oferta de Referência).

Por outro lado, como vem sendo referido, o facto de obter interligação das empresas demandadas no âmbito do presente processo não legitima que a Radiomóvel passe a prestar um serviço análogo ao que é disponibilizado pelos demais prestadores do serviço telefónico móvel/SMT/GSM-UMTS. O direito de utilização conferido à Radiomóvel refere, claramente, que as frequências consignadas se destinam a «ser exclusivamente utilizadas para a prestação do serviço móvel com recursos partilhados (SMRP)». Qualquer utilização que ultrapasse esta limitação será ilícita e, como tal, deve ser sancionada pela ANACOM no quadro dos poderes de supervisão e fiscalização que a lei lhe confere.

Com efeito, a ANACOM possui meios, recebe ou está em condição de solicitar elementos que lhe permitem fiscalizar o cumprimento das condições associadas ao direito de utilização conferidos à Radiomóvel e, em particular, se o tráfego entre membros de diferentes grupos fechados de utilizadores e entre os membros de cada grupo e utilizadores de outros serviços não excede os limites máximos fixados. Assim, não só da interligação não resulta habilitação para a prestação de outros serviços, como a violação das regras fixadas legitima uma intervenção sancionatória por parte da ANACOM que, sem prejuízo da aplicação das coimas que à infracção couberem, pode intervir no uso dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 110.º da LCE.

Dado o exposto, considerando o pedido apresentado pela Radiomóvel à ANACOM, as competências que a esta Autoridade são conferidas pelos artigos 10.º, 63.º e 66.º da LCE, bem como os objectivos de regulação que lhe compete prosseguir nos termos da alínea a) do n.º 1 e alíneas a), b) e d) do n.º 2 do artigo 5º da mesma Lei, e o disposto nas alíneas b), e), n) e q) do n.º 1 do artigo 6.º dos Estatutos anexos ao Decreto-Lei n.º 309/2001, de 7 de Dezembro, o Conselho de Administração da ANACOM nos termos da alínea l) do artigo 26.º dos acima referenciados Estatutos decide:

I. Ao abrigo do actual enquadramento regulamentar e atendendo em particular ao disposto no artigo 22.º da LCE, a Radiomóvel, enquanto operador do SMRP que presta um serviço de comunicações electrónicas disponível ao público em geral, tem direito de negociar a interligação e obter o acesso ou a interligação de outras empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público;

II. Em cumprimento das obrigações que legal e regulamentarmente lhes são impostas, nos termos dos artigos 64.º n.º 2 e 66.º da LCE, a PTC, a TMN, a Sonaecom e a Vodafone estão obrigadas a satisfazer os pedidos razoáveis de interligação da rede móvel da Radiomóvel com as redes fixas, móveis e nómadas que lhes pertencem, observando, na íntegra, as obrigações que lhes foram impostas no âmbito dos procedimentos de análise de mercado e, em particular, as obrigações de dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso e de não discriminação.

III. As empresas identificadas em II. devem, no prazo máximo de 90 dias contado a partir da data da decisão final proferida no âmbito do presente processo, comunicar à ANACOM a celebração dos acordos de interligação necessários a assegurar o direito da Radiomóvel de obter o acesso ou a interligação;

IV. Nos termos e para os efeitos do disposto do artigo 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo, a Radiomóvel, a PTC, a TMN, a Sonaecom e a Vodafone devem ser notificadas para, no prazo de 10 dias, se pronunciarem, querendo, sobre a decisão constante dos números anteriores.

Notas
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1 De acordo com a definição da alínea s) do artigo 13.º da LCE «operador» é «uma empresa que oferece ou está autorizada a oferecer uma rede de comunicações pública ou um recurso conexo», o que inquestionavelmente abrange a Radiomóvel.