1. Questões prévias


1.1. A existência de um litígio

Conforme referido no Relatório da audiência prévia e outras consultas 1, a Ar Telecom tece alguns comentários quanto à (in)existência de um litígio.

A este propósito recorda-se que, na sua resposta ao pedido de resolução de litígio da EDA, a Ar Telecom, embora se declare disposta a cumprir as obrigações que lhe são aplicáveis, questiona a legitimidade do pedido da EDA que lhe foi dirigido em 29 de janeiro de 2010 face ao enquadramento regulamentar vigente e considera que, do ponto de vista comercial, não faz sentido para qualquer das partes o tipo de acordo então proposto (vide pontos I - 2.3 e 2.4 supra).

Ora, estas considerações da Ar Telecom demonstram que, ainda que tivesse respondido à carta da EDA, a mesma resultaria numa recusa do pedido desta empresa, pelo menos nos termos exatos em que foi apresentado em janeiro de 2010.

Deve, pois, considerar-se que se verifica um litígio entre as partes quanto à satisfação do referido pedido concreto apresentado pela EDA à Ar Telecom e que o mesmo reveste a natureza de litígio transfronteiriço por ter surgido entre empresas estabelecidas em Estados-Membros diferentes (cf. artigo 12.º da LCE).

1.2. Competência do ICP-ANACOM

O n.º 1 do artigo 12.º da LCE prevê a aplicabilidade do mecanismo de resolução de litígios transfronteiriços quando esteja em causa um litígio surgido no âmbito das obrigações decorrentes do quadro regulamentar relativo às comunicações eletrónicas, entre empresas a elas sujeitas e estabelecidas em Estados-Membros diferentes.

Esta disposição transpõe o n.º 1 do artigo 21.º da Diretiva-Quadro que prevê a aplicabilidade deste procedimento "em caso de litígio transfronteiriço sobre matéria do âmbito da presente diretiva ou das diretivas específicas, surgido entre partes estabelecidas em Estados-Membros diferentes".

É igualmente clarificador o constante do considerando (32) da Directiva-Quadro, de acordo com o qual "Em caso de litígio entre empresas do mesmo Estado-Membro, num domínio abrangido pela presente diretiva ou pelas diretivas específicas, relacionado, por exemplo, com obrigações de acesso e interligação ou com os meios de transferir listas de assinantes, a parte lesada que tiver negociado de boa fé sem ter conseguido chegar a acordo, deve poder recorrer à autoridade reguladora nacional para a resolução do litígio". O que aqui se explicita é também aplicável aos litígios transfronteiriços, cujo âmbito de aplicação material coincide com o definido para os litígios surgidos entre empresas do mesmo Estado.

Tal significa que o que releva para a aplicação do procedimento de resolução de litígios transfronteiriços é o facto de o diferendo respeitar a matéria regulamentada pelo quadro relativo às comunicações eletrónicas, em particular ao cumprimento de obrigações sectorialmente previstas, pelas empresas a elas sujeitas, e à satisfação dos correspondentes direitos que a lei pode estabelecer a favor de empresas que não oferecem redes ou serviços de comunicações eletrónicas.

O presente litígio respeita ao cumprimento pela Ar Telecom da obrigação fixada no n.º 4 do artigo 50.º da LCE, a qual decorre do n.º 2 do artigo 25.º da Diretiva Serviço Universal que é uma das diretivas específicas a que se refere o citado artigo 21.º da Diretiva-Quadro. Esta obrigação recai sobre as empresas que atribuem números de telefone a assinantes e tem como beneficiárias as empresas que oferecem serviços de informações de listas e de listas acessíveis ao público, categoria em que a EDA se insere.

Face ao exposto, conclui-se que o ICP-ANACOM é competente para a resolução do presente litígio.

Notas
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1 Vide páginas 2 e 3.