1. Enquadramento


1.1. Os mercados grossistas de terminação de chamadas de voz redes telefónicas públicas individuais num local fixo – Obrigação de controlo de preços 

1.2. A Recomendação sobre o tratamento regulamentar das tarifas de terminação de chamadas nas redes fixas e móveis na UE 

1.3. Modelo de custeio para o serviço grossista de terminação fixa 


1.1. Os mercados grossistas de terminação de chamadas de voz redes telefónicas públicas individuais num local fixo – Obrigação de controlo de preços

Nos termos da Lei1 das Comunicações Eletrónicas (LCE), compete ao ICP - Autoridade Nacional de Comunicações (ICP-ANACOM) definir e analisar os mercados relevantes2, declarar as empresas com Poder de Mercado Significativo (PMS) e determinar as medidas adequadas às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas3 em conformidade com os princípios do direito da concorrência.

O ICP-ANACOM aprovou em 08.07.2004 a definição e análise dos mercados grossistas de terminação de chamadas em redes telefónicas públicas individuais num local fixo, no âmbito do qual foram identificadas com PMS as empresas do Grupo Portugal Telecom (Grupo PT) e todos os restantes operadores de rede fixa que atuavam nos mercados em causa. A deliberação de 17.12.2004 aprovou as obrigações a impor nos referidos mercados, entre as quais constava a obrigação de controlo de preços.

Em 2013, o ICP-ANACOM iniciou uma nova análise dos mercados grossistas de terminação de chamadas em redes telefónicas públicas num local fixo, tendo aprovado um Sentido Provável de Decisão4 (SPD) em 01.03.2013 para colocação em consulta pública e audiência prévia dos interessados. Analisados os comentários recebidos, o ICP-ANACOM aprovou, em 12.07.2013, um relatório5 relativo ao referido SPD e adotou um projeto de decisão final que foi notificado à CE nos termos do n.º 1 do artigo 57.º da LCE.

A CE veio a pronunciar-se sobre o projeto de decisão em causa, em 12.08.2013, tendo suscitado sérias dúvidas quanto à sua compatibilidade com a legislação da UE e considerando que criava entraves ao mercado único, essencialmente por falta de imposição de uma obrigação de acesso para a interligação IP aos operadores com PMS. Na sequência dessa comunicação da CE, o projeto de decisão foi retirado, e o ICP-ANACOM veio a aprovar6 em 27.08.2013 medidas provisórias e urgentes relativamente a esses mercados, entre as quais as relativas à obrigação de controlo de preços, nas quais se referia desde logo que era premente a necessidade de adotar preços de terminação fixados com base nos custos obtidos pela aplicação de modelos de custeio LRIC "puro", já que a metodologia em causa é adequada à realidade nacional, atendendo nomeadamente a que na perspetiva da eficiência estática, implica a menor distorção sobre os preços de retalho e, na perspetiva da eficiência dinâmica, a que contribui para proporcionar melhores condições concorrenciais nos mercados retalhistas a jusante entre operadores com quotas de mercado diferentes, assim como para aumentar o bem-estar dos consumidores.

Adicionalmente, atendendo à complexidade inerente ao desenvolvimento deste modelo e o tempo necessário à sua implementação plena, considera-se apropriado o lançamento de uma consulta pública aberta quanto às opções metodológicas a adotar no desenvolvimento do referido modelo (anexo III) sem prejuízo da decisão final a aprovar quanto à análise do mercado relevante e da decisão específica a adotar sobre o modelo e o preço máximo de terminação a aplicar a partir de julho de 2014, precedidas de nova consulta pública já então sobre um sentido provável de decisão.

1.2. A Recomendação sobre o tratamento regulamentar das tarifas de terminação de chamadas nas redes fixas e móveis na UE

A necessidade de criar um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (Diretiva 2002/21/CE7, doravante Diretiva Quadro), que permita o desenvolvimento no mercado interno da União Europeia (UE) de práticas regulatórias coerentes, bem como a existência de diferenças significativas na regulação dos preços de terminação das chamadas vocais e as divergências existentes nos diversos Estados Membros da UE, no que respeita às medidas de controlo de preços, nomeadamente a variedade de mecanismos escolhidos e as diferentes práticas associadas à sua implementação, levaram à publicação da Recomendação8 da Comissão Europeia (CE) sobre o tratamento regulamentar das tarifas da terminação de chamadas em redes fixas e móveis na UE, emitida no quadro das competências que lhe estão cometidas nos termos do artigo 19º da referida Diretiva.

Esta Recomendação estabelece que os preços de terminação sejam fixados ao nível dos custos eficientes baseados na aplicação de um modelo "bottom-up" utilizando a metodologia de custeio Long Run Incremental Cost (LRIC) por forma a calcular os custos prospetivos incrementais de longo prazo de um operador que utilize a tecnologia mais eficiente disponível no horizonte temporal relevante.

A referida Recomendação visa harmonizar a aplicação dos princípios da contabilização de custos nos mercados de terminação, estabelecendo uma abordagem comum para a terminação de chamadas vocais em redes individuais de comunicações eletrónicas (fixas e móveis), que promova a eficiência e a concorrência sustentável, maximizando os benefícios para os consumidores em termos de preços e de ofertas de serviços.

Para efeitos do modelo LRIC a desenvolver, a Recomendação da CE considera que o serviço de terminação fornecido a terceiros é o incremento relevante para o apuramento do custo de terminação das chamadas vocais em redes fixas individuais.

As Autoridades Reguladoras nacionais (ARN) devem assim apurar a diferença entre os custos totais de longo prazo de um operador hipotético eficiente que preste a totalidade dos serviços considerados e os custos totais de longo prazo incorridos por um operador hipotético eficiente que preste a totalidade dos serviços considerados, com exceção do serviço de terminação de chamadas de voz a terceiros. Esta diferença traduz o custo incremental (ou "evitável") associado à prestação do serviço de terminação de chamadas, que dividido pelo número de minutos de terminação resulta no valor do custo unitário. A aplicação da Recomendação da CE exclui do cálculo os custos comuns incorridos pelos operadores no âmbito das suas atividades, bem como qualquer outro tipo de incrementos que permita a recuperação de custos não relacionados com o tráfego de terminação.

Importa salientar que nos termos do n.º 2 do art.º 19º da Diretiva Quadro (e da LCE) os Estados Membros devem garantir que as ARN tenham na melhor conta ("utmost account") as Recomendações da CE, visando um objetivo de harmonização a nível europeu e de desenvolvimento do mercado interno, objetivo esse a que os reguladores nacionais estão comprometidos. Seria assim necessário neste contexto justificar circunstanciadamente, perante a própria CE, o afastamento da Recomendação 2009/396/CE na base de razões atendíveis que, à partida, conforme se conclui no âmbito da análise dos mercados grossistas de terminação de chamadas de voz redes telefónicas públicas individuais num local fixo, não se identificam no caso português.

1.3. Modelo de custeio para o serviço grossista de terminação fixa

No âmbito da análise9 que suportou a deliberação de 27.8.2013, o ICP-ANACOM adiantou que se justificava manter uma obrigação de controlo de preços sobre todos os operadores com PMS nestes mercados.

Mais referiu que a supressão dessa obrigação resultaria numa maior incerteza relativamente aos preços grossistas do serviço de terminação, antecipando-se também que se iria assistir a um agravamento desses preços, com sérios riscos de ocorrência de preços anormalmente elevados, atenta a natureza monopolista da sua prestação e a ausência de quaisquer incentivos para a redução dos preços; situação que só pode ser contrariada eficazmente através de um controlo de preços suportado na orientação para os custos. O ICP-ANACOM considerou ainda que não havia razões para alterar a conclusão relativa à adequação da metodologia de custeio assente em LRIC, como forma de fixar os preços de terminação.

Adicionalmente, e também no âmbito da análise já referida, o ICP-ANACOM adiantou, no que respeita à escolha do modelo de custeio para estabelecer o preço de interligação, e em conformidade com o referido na Recomendação relativa às Terminações, que será apropriado que estes preços sejam fixados ao nível dos custos eficientes baseados na aplicação de um modelo bottom-up utilizando a metodologia de custeio LRIC, contribuindo, deste modo, para a redução dos preços da terminação de forma significativa e potenciando o desenvolvimento da concorrência nos mercados a jusante.

A este respeito recorda-se que no documento da análise de mercado aprovado a título de medidas provisórias e urgentes foi referido que "em relação à opção por um modelo LRAIC "+" (o qual incorpora um conjunto de custos comuns a vários serviços) ou LRIC "puro" (que assenta nos custos evitáveis do serviço de terminação, excluindo quaisquer custos comuns), o ICP-ANACOM, na análise efetuada da adequabilidade da metodologia preconizada na referida Recomendação, e da sua compatibilidade com os objetivos do quadro regulamentar nacional e europeu, considera que a escolha do segundo é a mais adequada à realidade nacional por ser o modelo que fomenta de forma mais efetiva a concorrência nos mercados a jusante entre operadores com quotas de mercado diferentes, que mais contribui para o "level playing field" nesses mercados, que mais contribui para o aumento da contestabilidade do mercado, para o reforço da capacidade de investimento dos operadores e para o bem-estar dos consumidores em geral".

Em qualquer caso, a escolha do modelo LRIC "puro", para além de se caraterizar como uma prática adotada por outras ARN, também encontra sustentação na aplicação da Recomendação da CE, não se identificando razões objetivas nem circunstâncias específicas nacionais para uma aproximação distinta da que já é aplicada nas terminações das redes móveis.

Sem prejuízo das especificidades na aplicação do modelo, cujo desenvolvimento, como referido anteriormente, está a decorrer presentemente, e que implicará necessariamente uma consulta ao mercado sobre um SPD relativo à sua aprovação e à aplicação do resultado dele decorrente, à semelhança do efetuado com o modelo de custeio desenvolvido para os mercados móveis, o ICP-ANACOM entende à partida que o modelo LRIC "puro" é adequado como se disse no contexto da aplicação do princípio da orientação dos preços para os custos aplicável neste mercado.

Assim, o ICP-ANACOM conclui que a metodologia de custeio LRIC "puro" é a opção de custeio mais adequada para determinar os preços de terminação fixa em Portugal, sendo que, naturalmente, o desenvolvimento do modelo e dos respetivos parâmetros terão em consideração as especificidades nacionais e a informação solicitada aos operadores nacionais, sem prejuízo das preocupações de eficiência que serão naturalmente incorporadas no modelo, conforme decorre da aplicação da Recomendação da CE. Neste contexto, é de assinalar que são vários os reguladores europeus que já notificaram a CE sobre as obrigações de controlo de preços impostas nestes mercados e que já definiram preços baseados em LRIC "puro".

Tendo em conta a obrigação de controlo de preços a que os operadores com PMS nos mercados grossistas de terminação de chamadas de voz em redes telefónicas públicas num local estão sujeitos e o contexto histórico aqui sumariado, o ICP-ANACOM lançou, em 09/10/2012, um concurso público com vista ao desenvolvimento e implementação de um modelo de custeio de terminação fixa, tendo esse projeto sido adjudicado à consultora Analysys Mason Limited (adiante designado por "consultor") em 05/03/2013.

Decorrido este tempo, encontrando-se neste momento o consultor a desenvolver o referido modelo de custeio, para o qual tem contado com a disponibilidade dos operadores fixos (que se assinala) no fornecimento de informação relevante para o desenvolvimento do referido modelo, entendeu o ICP-ANACOM ser importante o lançamento de uma consulta sobre as opções metodológicas a serem incluídas no modelo a desenvolver. Para este efeito, o consultor elaborou um relatório "Conceptual approach for the fixed BU-LRIC model" (ver anexo III) quanto aos princípios sobre os quais se deverá alicerçar a implementação do modelo de custeio de terminação fixa.

Notas
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1 Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro.
2 Art.º 56.º da Lei n.º 5/2004.
3 Art.º 18.º da Lei n.º 5/2004.
4 Mercado grossista de terminação de chamadas na rede telefónica pública num local fixo - consultahttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1154725.
5 Decisão sobre a retirada do projeto de decisão relativo ao mercado grossista de terminação de chamadas na rede telefónica pública num local fixo notificado à Comissão Europeia - Processo PT/2013/1491https://www.anacom.pt/render.jsp?categoryId=349926.
6 ANACOM adota medidas provisórias e urgentes sobre terminação de chamadas na rede fixahttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1171709.
7 Alterada pelos Regulamentos (CE) n.º 717/2007, de 27/06/2007, e n.º 544/2009, de 18/06/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho e pela Diretiva 2009/140/CE, de 25/11/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho.
8 Recomendação da Comissão Europeia, de 7 de Maio de 2009http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:124:0067:0074:PT:PDF.
9 Mercado grossista de terminação de chamadas na rede telefónica pública num local fixohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1154722.