7. Metodologias de reconhecimento de custos


Existem actualmente várias metodologias de reconhecimento de custos que diferem entre si no tipo de custos considerados e na forma como estes são distribuídos. De seguida são apresentadas as três principais metodologias consideradas pelo ICP-ANACOM sem prejuízo da existência de outras, como custos marginais, EDC (Embedded Direct Costs) ou ECPR (Efficient Component Pricing Rule).

7.1. Custos completamente distribuidos

O FDC ou custos completamente distribuídos aloca todos os custos da empresa aos seus produtos e serviços. Assim, inclui todos os custos directamente e indirectamente atribuíveis, distribuídos de acordo com um método de alocação predefinido. A ideia desta metodologia é que cada unidade produzida por uma empresa com vários serviços deveria gerar pelo menos rendimento suficiente para cobrir o custo de a produzir, pelo que a totalidade dos custos são distribuídos pelos vários serviços.

Pela metodologia de reconhecimento de custos FDC são incluídos todos os custos directamente atribuíveis e parte dos indirectamente atribuíveis
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Pela metodologia de reconhecimento de custos FDC são incluídos todos os custos directamente atribuíveis e parte dos indirectamente atribuíveis.

A utilização do FDC surge com o desenvolvimento histórico da contabilidade. De facto, a recolha de informação de custos foi motivada pela necessidade de controlar e reportar o desempenho financeiro da empresa a accionistas externos. O FDC é um sistema de custeio que é relativamente objectivo e passível de ser verificado por fonte externa.

Esta metodologia tem também como vantagem o facto de ser fácil de implementar, uma vez que a informação já existe ou é facilmente produzida, e de permitir às empresas investimentos específicos em alguns produtos/serviços, dado que ao repartir os custos pelas várias áreas de acordo com uma relação de causalidade, permite inferir acerca da rentabilidade dessas áreas. A informação é retirada da contabilidade geral da empresa, pelo que reflecte os activos fixos usados para efectuar o serviço, a capacidade instalada e utilização de rede que lhe são inerentes. Assim, existe uma forte relação entre as demonstrações financeiras e as contas internas da empresa, o que as torna menos complexas de auditar.

É, no entanto, criticada devido à arbitrariedade que pode existir na distribuição dos custos comuns aos vários serviços/produtos, o que poderá gerar uma grande variedade de resultados, não existindo um critério sobre qual o mais eficiente. De facto, a empresa vai ter incentivo para aumentar os custos a atribuir à actividade da empresa que opere no mercado menos competitivo, de forma a aumentar as suas possibilidades de rendimento.

Outra crítica relacionada com a utilização do FDC como base de reconhecimento de custos para decisões de preços prende-se com o facto de não promover a eficiência económica (dado que o conceito de custo marginal não está inerente a este método).

7.2. Custos incrementais de longo prazo

O custo incremental corresponde à variação nos custos totais da empresa resultante de uma variação substancial na quantidade produzida, ou seja, é o custo adicional que uma empresa incorre para fornecer um determinado serviço ou o custo que a empresa não incorreria caso decidisse não fornecer esse serviço.

No limite, os custos incrementais são iguais aos custos marginais, se o incremento definido corresponder a uma unidade de produção infinitamente pequena. A diferença entre este conceito e o de custo marginal é o facto de além de incluir os custos variáveis também incluir alguns custos de capital. Os custos variáveis são incluídos via relação directa com a quantidade produzida. Os custos de capital são incluídos através do custo do aumento da capacidade da empresa, de forma a esta conseguir satisfazer uma procura permanentemente crescente.

Pela metodologia de reconhecimento de custos LRIC são incluídos todos os custos directamente atribuíveis
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Pela metodologia de reconhecimento de custos LRIC são incluídos todos os custos directamente atribuíveis.

Tendo em conta que o conceito de custo incremental se enquadra no conceito de custo marginal, e dado que a teoria económica defende que um preço que iguale o custo marginal gera eficiência económica (visa introduzir a distorção mínima no mercado maximizando o somatório dos excedentes do produtor e do consumidor) então também os custos incrementais a geram. Além disso, ultrapassa o maior problema da utilização do custo marginal, que é a análise de uma variação unitária na produção. Acresce que dependendo do objectivo a atingir, neste caso a demonstração da orientação dos preços para os custos, pode haver interesses em definir incrementos maiores ou menores.

O LRIC (Long Run Incremental Cost) é obtido distribuindo o investimento por um período (teórico) suficientemente longo de tempo para que a componente de custos fixos se torne variável e o operador invista para optimizar a rede. De facto, o uso do LRIC implica uma revisão dos custos a longo prazo, ou seja, o horizonte temporal em que todos os custos (incluindo os custos de capital e de capacidade de rede) são variáveis e incluídos no custo incremental.

Desta forma, os custos incrementais de longo prazo fornecem aos agentes económicos uma base de custo importante para decisões de investimento, particularmente em sectores intensivos em capital como é o caso das comunicações electrónicas.

Custos baseados em LRIC reflectem condições de mercado cada vez mais competitivas usando o preço de mercado das melhores tecnologias disponíveis e assumindo que a rede está optimizada. Este modelo estima os custos de instalação, manutenção e operação de uma rede, assim como os custos incorridos por um novo operador para fornecer o mesmo conjunto de serviços fornecido pelos operadores do mercado. O facto de o LRIC representar o custo total que um operador incorreria para entrar no mercado garante que os princípios de concorrência justa e não discriminação são satisfeitos, assegurando que todos os operadores beneficiam das economias de escala do operador incumbente mesmo que só utilizem uma parte dos recursos.

O problema de utilização dos custos incrementais é o facto de estes ignorarem a recuperação de custos comuns. Assim, para assegurar a viabilidade de qualquer empresa no longo prazo, o LRIC tem que ser considerado como um valor mínimo, isto é, os preços devem ser iguais ao LRIC acrescidos de um prémio.

Existem várias formas para determinar estes prémios, sendo que a mais consensual é a teoria de preços Ramsey que afirma que esses prémios devem ser inversamente proporcionais às elasticidades da procura dos vários bens. Esta teoria permite minimizar a redução do bem-estar causada pela necessidade de recuperar os custos conjuntos e comuns por via de um aumento nos preços. Todavia, como se baseia em perspectivas de evolução da procura, exige que se recolha uma grande quantidade de informação acerca das elasticidades da procura pelo que poderá ser de aplicação complexa além de que não tem em conta noções de equidade ou serviço universal.

Assim, embora se concorde que a distribuição dos custos comuns com base nas elasticidades da procura permite atingir eficiência económica, na prática ela é dificilmente exequível, pelo que esta é normalmente realizada com base nas proporções de determinadas chaves de distribuição (e.g. volume ou custos directos) já atribuídas aos vários produtos/serviços. Esta questão está desenvolvida no ponto 8.4 desta consulta.

Entende-se, assim, que os preços baseados em LRIC mais uma margem fornecem os sinais apropriados a produtores e consumidores e asseguram entradas e utilização eficientes da infra-estrutura de comunicações electrónicas.

7.3. Custos isolados

O Stand Alone Costs (SAC) é uma metodologia de custeio que se baseia no custo de se fornecer um produto/serviço, admitindo que mais nenhum produto/serviço seria prestado. Assim, atribui todos os custos da empresa a esse produto/serviço. Numa empresa envolvida na produção de mais de um produto/serviço, a utilização deste sistema de custeio faz com a soma dos SAC de cada serviço seja maior que o total de custos incorridos pela empresa.

Pela metodologia de reconhecimento de custos SAC são incluídos todos os custos
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Pela metodologia de reconhecimento de custos SAC são incluídos todos os custos.

Assim, este conceito não gera eficiência económica, uma vez que transporta todos os custos da empresa para os consumidores e permite a uma empresa com mais de um produto uma dupla recuperação dos custos.

Mesmo assim, este conceito de custo é útil para o estabelecimento de um preço máximo para um produto/serviço dado que permite à empresa a recuperação de todos os custos através desse produto/serviço.

7.4. Conclusão e questão

A teoria económica conclui que um preço igual ao custo marginal gera eficiência económica. Deste modo, a utilização de custos incrementais, que se baseia na noção de custo marginal ultrapassando as dificuldades de calcular variações unitárias na produção, também permite alcançar essa eficiência económica.

Pode-se estabelecer uma relação entre os custos reconhecidos por uma metodologia LRIC, SAC e FDC. Com um sistema LRIC obtemos um limite mínimo para os custos, na medida em que a fixação de preços inferiores significaria que nem todos os custos incrementais seriam recuperados. De igual modo, o SAC pode ser entendido como o limite máximo, uma vez que a definição de preços superiores a este valor resultaria na recuperação de todos os custos incrementais, mais todos os custos comuns e um montante em excesso. O FDC situar-se-á entre estes limites, pois permite a recuperação dos custos incrementais mais uma parte dos custos comuns.

Efectivamente, embora exista um risco associado à fixação de preços demasiado baixos (não permitindo a recuperação de todos os custos relevantes), também existe um risco inerente à fixação dos mesmos preços a um nível demasiado elevado, o que permitiria ao operador dominante explorar o seu poder de mercado, ter lucros excessivos e possivelmente promover entradas ineficientes no mercado em que opera. Assim, o preço mais eficiente a nível económico e que permite a viabilidade da empresa é um preço compreendido entre o LRIC e o SAC.

Neste contexto, o ICP-ANACOM entende que, para efeitos regulatórios, a metodologia adequada é aquela que permite calcular um intervalo de custos (LRIC a SAC) e não um valor específico com o custo LRIC (incluindo uma margem específica para a cobertura dos custos comuns). Assim, uma primeira avaliação da orientação para os custos do preço de um determinado serviço/produto passará por verificar onde esse valor se situa no intervalo definido pelo LRIC e SAC.

Questão 10: Para o ICP-ANACOM a metodologia de reconhecimento de custos adequada situa os custos no intervalo LRIC-SAC. Assim, é entendimento do ICP-ANACOM que os operadores notificados devem adoptar uma metodologia LRIC mais um mark-up que lhes permita recuperar parte dos custos comuns. Identifica algumas incorrecções ou limitações neste entendimento? Justifique.