Intervenção da Administradora da ANACOM no seminário ''Comércio Electrónico: Impactos e Oportunidades para a Economia Portuguesa'' da ACEP, realizado a 4 de Maio de 2006, em Lisboa


/ Atualizado em 11.05.2006

 3ª Semana do comércio electrónico em Portugal

Associação do Comércio Electrónico em Portugal (ACEP)

Sessão inaugural
''Comércio electrónico: Impactos e oportunidades para a economia portuguesa''

4 de Maio de 2006

Senhor Presidente da ACEP,
Senhor Presidente do conselho de administração da Fundação Portuguesa das Comunicações,
Caros Colegas deste painel,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Em primeiro, lugar, quero agradecer à organização, na pessoa do Presidente da ACEP, Dr. Alexandre Nilo Fonseca, o convite dirigido à ANACOM para se fazer representar nesta sessão inaugural da 3ª Semana do Comércio Electrónico.

O comércio electrónico é hoje indissociável da realidade em que vivemos. Em poucos anos, as redes digitais e, em especial, a Internet alteraram, de forma profundamente revolucionária, a economia, o trabalho e até mesmo a vida privada de todos nós.

Passada uma primeira fase de euforia na área das tecnologias da informação e comunicação, e apesar do abrandamento verificado ao nível da economia digital, assiste-se agora a um período de consolidação e crescimento sustentado do mercado do comércio electrónico.

À semelhança do que acontece no resto do mundo, o comércio electrónico em Portugal está a dar claros sinais de desenvolvimento. A nível nacional, o acesso à Internet a partir de casa teve uma taxa de crescimento médio anual de quase 30% entre 2002 e 2005, o que se reflectiu, igualmente, numa tendência de crescimento do número de utilizadores que recorreram à Internet para efectuar compras de bens e serviços. Ao nível das empresas, a utilização deste novo meio de transacção é muito mais expressiva, mesmo para as pequenas empresas, que cada vez mais o consideram como um factor essencial para aumentar a sua competitividade e criar novos produtos e serviços.

Uma vez que o comércio electrónico assenta no desenvolvimento das tecnologias da informação, as suas potencialidades tendem a acompanhar, naturalmente, as evoluções deste domínio. E é sabido como essa evolução tem sido notável! Veja-se o caso do acesso em banda larga ou do acesso em multiplataforma, em que é possível estabelecer uma ligação à Internet sem recurso ao tradicional PC, mas antes através de telemóveis de terceira geração e da televisão digital. Estes desenvolvimentos estão na origem de uma vasta gama de novas oportunidades para os serviços em linha, uma vez que os novos serviços, aplicações e conteúdos irão criar novos mercados e proporcionar meios para aumentar a produtividade das empresas e para garantir um melhor acesso às ferramentas de informação e comunicação por parte dos cidadãos.

Não podemos, porém, ignorar que o comércio electrónico tem fragilidades óbvias, relacionadas com a especificidade do meio utilizado e com o carácter transnacional das operações, tanto para os interesses públicos como para os direitos subjectivos envolvidos na sua utilização.

Se o acto comercial tradicional assentava numa relação muito directa entre o fornecedor e o cliente e entre este e o produto ou serviço, com o comércio electrónico dá-se uma alteração substancial a esta relação. E essa alteração traz consigo novos riscos acrescidos ? entre outros, novas possibilidades de erros na formação, na declaração e na transmissão da vontade, um maior risco de liquidação financeira e uma maior percepção de insegurança jurídica nas transacções electrónicas.

Ciente de que a insegurança jurídica consubstanciava um factor de retracção do comércio electrónico, tornou-se evidente para os Estados e para as diversas entidades supranacionais, em particular a União Europeia, a necessidade de regulação desta actividade, sendo que tal esforço teria que ser necessariamente complementado por uma eficiente supervisão do correspondente quadro regulatório instituído a nível nacional.

Assim, a nível comunitário, foi aprovado, em 2000, o enquadramento legal de referência para o comércio electrónico no mercado interno (e para os designados serviços da sociedade de informação, em geral), removendo os obstáculos à prestação de serviços em linha na União Europeia, de modo a assegurar um ambiente de segurança jurídica ao negócio e aos cidadãos [Directiva 2000/31/CE , de 8 de Junho de 2000 ? conhecida como Directiva para o Comércio Electrónico].

Como é sabido, a transposição das regras comunitárias para o ordenamento jurídico nacional teve lugar em 2004 [Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de Janeiro]. O diploma regulamenta, em linhas gerais, a prestação dos serviços da sociedade de informação, a responsabilidade dos prestadores de serviços em rede, as comunicações comerciais em linha e as comunicações não solicitadas e a contratação electrónica, estabelecendo, ainda, o respectivo quadro sancionatório.

Ao arrepio da experiência internacional e do disposto na própria Directiva comunitária, este diploma veio ainda criar um procedimento de solução provisória de litígios que surjam quanto à licitude de conteúdos disponíveis em rede, dada a extrema urgência que pode haver numa rápida decisão sobre a matéria. Confia-se essa função à entidade de supervisão respectiva, sem prejuízo da solução definitiva do litígio, que só poderá ser judicial.

Verifica-se, assim, que o legislador português optou pela consagração de um mecanismo administrativo, de índole extrajudicial, quando a Directiva parecia, claramente, apontar para a adaptação dos mecanismos judiciais já disponíveis nos ordenamentos jurídicos nacionais.

Não sendo este o local apropriado para questionar a solução preconizada, verifica-se, pela experiência adquirida nestes dois primeiros anos de vigência do diploma, que o mecanismo em causa se tem revelado inoperante, conduzindo, na realidade, a uma profunda diversidade de interpretações por parte das entidades administrativas envolvidas. Dessa forma, sai prejudicada a boa e coerente aplicação do diploma, em condições de segurança jurídica, e é potenciada a existência de conflitos negativos e positivos de competência.

Assim, pode impor-se como oportuna, num futuro próximo, a revogação deste instituto - a solução provisória de litígios - como forma de minimizar os graves e potenciais constrangimentos que o diploma faz impender sobre qualquer entidade que pretenda vir a aplicar com eficiência e rigor o regime de resolução de conflitos.
Para assegurar a aplicação do diploma relativo ao comércio electrónico, o seu regime inclui um modelo de supervisão no âmbito do qual foi instituída uma entidade de supervisão central ? a ANACOM ? com atribuições em todos os domínios regulados pelo diploma, salvo nas matérias em que lei especial atribua competência sectorial a outra entidade.

Assim, a par da entidade de supervisão central, o Decreto-Lei n.º 7/2004 atribui competência às entidades sectoriais de supervisão, designadamente à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, ao Banco de Portugal, ao Instituto de Seguros de Portugal e à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos. As funções destas entidades de supervisão circunscrevem-se, neste âmbito, às matérias para as quais sejam sectorialmente competentes. Neste sentido, a respectiva intervenção nos seus domínios específicos de actuação constitui o limite dos poderes atribuídos à ANACOM, enquanto entidade de supervisão central.

Em suma, e atendendo ao carácter transversal do quadro estabelecido pelo regime legal aplicável, pretendeu-se, com este modelo, não alterar a distribuição material de competências que resulte de legislação anterior, fornecendo apenas um critério geral que possa permitir a resolução de casos de competência aparentemente concorrente e evitar o vazio em situações de conflito negativo de competências.

Para que o comércio electrónico seja utilizado de forma segura e eficaz é, naturalmente, necessário que o enquadramento legislativo que envolve os diversos aspectos associados à transacção de bens e serviços acompanhe a evolução dos mercados no contexto da sociedade da informação. Assim, ao lado da regulamentação dos serviços da sociedade da informação, temos assistido à criação de um quadro legislativo que contempla outras preocupações e necessidades de todos os que se socorrem deste novo meio de comércio. É o caso do regime jurídico aplicável aos documentos electrónicos e à assinatura digital, à factura electrónica, à garantia dos direitos de propriedade intelectual na utilização do comércio electrónico, à segurança das redes e confidencialidade dos dados, sendo estas últimas matérias especialmente sensíveis no quadro da sociedade actual.

No entanto, neste domínio tão específico como o do comércio electrónico, a regulamentação, por si, não é suficiente: paralelamente, a auto-regulação assume um papel fundamental, como um meio para uma maior consciencialização dos players. Com efeito, o sucesso do comércio electrónico depende da adopção de regras e práticas comerciais que assegurem a segurança das transacções, a confiança no mercado e a sua própria credibilidade.

Aliás, é assumindo esta preocupação que o próprio diploma sobre o comércio electrónico veio impor às entidades de supervisão ? e à própria ANACOM, enquanto entidade de supervisão central ? os deveres de estimular a criação e a difusão de códigos de conduta pelos diferentes agentes, ao mesmo tempo que lhes atribui a legitimidade para, quando seja caso disso, impugnar os códigos de conduta adoptados.

Na prática, a auto-regulação na área do comércio electrónico teve uma explosão em 2000 e 2001, com particular incidência em países como o Reino Unido, a França, a Alemanha e a Bélgica, mas tem vindo a desacelerar desde então, justificando o recente apelo da Comissão Europeia a uma maior actividade de fomento por parte das entidades públicas e do sector privado nos diversos Estados-Membros.

Neste contexto, a ACEP poderá assumir um papel essencial, enquanto fórum de reflexão e como meio de difusão das boas práticas comerciais e de uma nova ética, que permita que valores como a segurança, a confiança e a credibilidade possam garantir o sucesso do comércio electrónico. A minha presença nesta cerimónia, em representação da ANACOM, constitui um pretexto para reafirmar a nossa firme intenção de em tudo contribuir para que este desiderato seja atingido, cientes de que estaremos, juntos, a caminhar para uma maior divulgação e desenvolvimento do comércio electrónico.

Também a UMIC se apresenta, desde os primeiros passos dados ao nível da implementação da sociedade da informação em Portugal, como uma peça determinante na definição e viabilização de um caminho estratégico e sustentado para o comércio electrónico a nível nacional, sendo de extrema relevância o acompanhamento que efectua de forma sistemática no que se refere à evolução dos mercados a nível nacional e internacional.

Associadas ao comércio electrónico, encontramos ainda, ao nível internacional e, marcadamente, ao nível da União Europeia, um conjunto de outras iniciativas que visam promover o tratamento de problemas específicos emergentes da nova sociedade da informação. Veja-se o caso do Plano de Acção para uma Internet mais Segura, que pretende fomentar uma utilização mais segura da Internet e das novas tecnologias em linha, através do financiamento de acções de combate aos conteúdos ilegais e lesivos nas redes mundiais, com particular destaque para o domínio da protecção dos menores. Também neste domínio, a ANACOM, consciente da extrema relevância e actualidade do tema, mas sem deixar, porém, de considerar que não deveria, nem poderia, promover, por si, um projecto desta índole, assumiu um papel na sensibilização da sociedade portuguesa para a necessidade de uma iniciativa nacional no âmbito do referido Plano.

Antes de terminar, não posso deixar louvar a congregação de esforços das entidades envolvidas na organização e realização desta iniciativa, que visa potenciar o comércio electrónico em Portugal.

Assim, associando-se ao trabalho desenvolvido por todas as entidades com valências no domínio da sociedade da informação, a ANACOM, investida no espírito de missão que sempre tem caracterizado a sua conduta, posiciona-se no sentido de melhor contribuir para uma eficiente supervisão e divulgação do comércio electrónico em Portugal, visando, nomeadamente, que sejam plenamente atingidos os objectivos definidos na Estratégia de Lisboa e no Plano Tecnológico.

Por fim, permitam-me que destaque, com algum orgulho, o facto de a sessão inaugural da Semana do Comércio Electrónico ter lugar nas instalações da Fundação Portuguesa das Comunicações, de que a ANACOM é membro fundador ? tal como, aliás, os CTT - Correios de Portugal, aqui representados pelo seu Presidente. E faz todo o sentido.

Com efeito, os objectivos desta Fundação não se limitam à preservação e divulgação do património histórico do sector das comunicações numa perspectiva de passado; eles incluem, também, a divulgação das novas tecnologias e do seu contributo para o desenvolvimento económico e social do país e da comunidade. Tal como nos habituámos a falar de desenvolvimento a uma escala bem mais global do que a que é dada pelas fronteiras físicas, também quando falamos de comunicações estamos a abarcar uma enorme diversidade de actividades.

É, pois, gratificante ver abertas as portas da Fundação Portuguesa das Comunicações a uma iniciativa como esta, na linha, aliás, do que vem sendo feito e que queremos privilegiar.

Muito Obrigada.