Intervenção


/ Atualizado em 21.11.2005

(Última actualização - 21.11.2005)

Senhor Presidente do Congresso,
Senhor Presidente da APDC,
Dr. Bernd Langeheine,
Meu caro Prof. Aníbal Santos,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,


1. Introdução

Assumi aqui, há um ano, o compromisso de apresentar neste congresso o balanço das actividades de regulação da ANACOM em 2005. A escolha deste local para fazer a avaliação de um ano de regulação sectorial justifica-se, naturalmente, pelo facto de a APDC constituir um ponto de referência obrigatório para o debate de ideias neste sector.

A intervenção do regulador em 2005 foi orientada por dois objectivos principais: o reforço das condições concorrenciais, por um lado, e, por outro, a redução de alguns preços pagos pelo consumidor que se encontravam desalinhados dos padrões médios europeus.

Merece uma referência muito especial, nestes últimos doze meses, o desenvolvimento de análises de mercado, que decorreu de acordo com um calendário publicamente divulgado. Este processo envolve três fases distintas - definição de mercados, avaliação da existência de situações de poder de mercado significativo e definição de obrigações - tendo abrangido mercados retalhistas e grossistas de banda estreita, mercados grossistas de banda larga, mercados retalhistas e grossistas de linhas alugadas e o mercado de terminações de chamadas em redes móveis.

Portugal encontra-se numa fase claramente avançada deste processo, quando comparado com os restantes países da União Europeia. Sublinhe-se, também, que as notificações apresentadas pela ANACOM não tiveram, praticamente, comentários da Comissão, o que evidencia a sua correcção técnica e formal.

A implementação das obrigações definidas nestas análises de mercado teve, como terei oportunidade de referir nesta intervenção, um reflexo muito visível no funcionamento dos mercados, em termos de promoção da concorrência e de benefícios para os consumidores finais.


2. Criação de Condições de Concorrência

Ao longo de 2005, a ANACOM implementou um conjunto vasto de medidas de regulação - ao nível das ofertas grossistas do operador histórico - no sentido de assegurar condições de level-playing field para todos os operadores do mercado:

a) Em primeiro lugar - e porque constituiu uma prioridade estratégica para o regulador sectorial - foram criadas condições para uma efectiva utilização da Oferta do Lacete Local pelos operadores alternativos; a actuação da ANACOM incidiu - de uma forma gradual - sobre prazos, preços, compensações e processos, ou seja sobre os aspectos relevantes para o sucesso desta oferta;

A intervenção do regulador teve efeitos bem visíveis no mercado. No terceiro trimestre do ano em curso, de acordo com dados hoje tornados públicos pela ANACOM, o número de acessos desagregados atingiu cerca de 43.000 - o que constituindo uma pequena fracção do mercado é cerca de 7 vezes superior ao verificado no trimestre homólogo de 2004 - tendo-se verificado também um aumento do número de operadores que utilizam esta oferta.

b) Refira-se, em segundo lugar, o conjunto de intervenções na oferta ?Rede ADSL PT?, sendo de destacar, por um lado, a imposição da oferta de uma classe de 2 Mbps no sentido descendente e, por outro, a proibição da comercialização de ofertas retalhistas de banda larga de 1 e 2 Mbps sobre a rede de distribuição de cabo antes da entrada em vigor das correspondentes condições grossistas na oferta ?Rede ADSL PT?;

A ANACOM assegurou a existência de várias ofertas grossistas complementares e coerentes entre si - IP, ATM e OLL - proporcionando aos operadores, através do investimento em infra-estrutura própria, subir na ?escada de investimento?, permitindo níveis crescentes de diferenciação das ofertas disponibilizadas aos utilizadores finais.

c) Manutenção de condições grossistas relativamente equilibradas ao nível da interligação e dos circuitos alugados, em valores ligeiramente abaixo das médias da União Europeia;

d) Desenvolvimento dos procedimentos de consulta pública necessários ao desenvolvimento de novas ofertas grossistas que irão seguramente reforçar as condições concorrenciais:

- a Oferta de Realuguer da Linha de Assinante (ORLA), que será uma realidade no mercado ainda em 2005;
- a tarifa plana de interligação, cuja implementação deverá ocorrer no final do primeiro trimestre de 2006;
- e, finalmente, a Oferta de Referência de Acesso a Condutas (ORAC) cuja data provável de implementação é também o primeiro trimestre do próximo ano.

e) Redução significativa dos preços de terminação dos operadores móveis - que se encontravam nos níveis mais elevados da União Europeia - e definição de uma trajectória de redução gradual até Outubro de 2006.


3. Benefícios Claros para os Consumidores

Apesar da intervenção da ANACOM ser, primordialmente, ao nível das ofertas grossistas, o objectivo final é, naturalmente, que a actividade de regulação se traduza em claros benefícios para os consumidores finais. Sob este ponto de vista, 2005 foi um ano extremamente positivo para os consumidores:

a) no que se refere à voz, o preço das chamadas locais reduziu-se cerca de 6 por cento, enquanto o preço das chamadas regionais, nacionais e fixo-móvel registou reduções entre 20 e 30 por cento;

b) aparecimento de ofertas de voz e banda larga extremamente competitivas - baseadas na oferta grossista OLL - e que em alguns casos proporcionaram reduções de preços ao consumidor final de cerca de 50 por cento;

c) a nível de débito, a classe de 2 Mbps tornou-se a classe mais utilizada - correspondendo já a cerca de 50 por cento dos acessos ADSL - o que traduz benefícios muito importantes para os consumidores;

A actividade do regulador sectorial - a par, naturalmente, das iniciativas dos operadores e de outras entidades públicas - possibilitou uma expansão muito rápida do mercado de banda larga. De acordo com dados hoje divulgados pela ANACOM, o número total de clientes de banda larga registou, no terceiro trimestre do corrente ano, um crescimento de 8.0 por cento em relação ao trimestre anterior e de 51,4 por cento em relação ao trimestre homólogo. Cerca de 80 por cento dos novos clientes de banda larga optaram por acessos através da tecnologia ADSL.

A taxa de penetração de acessos de banda larga larga1https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55129 continuou a situar-se a níveis próximos dos valores médios europeus (EU-25), sendo mesmo superiores aos verificados em países como a Alemanha, Espanha e Itália.

d) finalmente, no segmento móvel apareceram tarifários sem distinção nos preços das chamadas on-net/off-net, em resultado da magnitude da redução das terminações móvel-móvel e também da previsibilidade associada à trajectória de decréscimo imposta pela ANACOM aos operadores móveis;

Sublinhe-se, a propósito, que os preços finais ao consumidor dos serviços de comunicações electrónicas são praticamente os únicos - se não mesmo os únicos de toda a economia - que têm registado reduções sistemáticas, particularmente acentuadas em 2005, o que traduz importantes ganhos de produtividade de um dos sectores mais dinâmicos da economia portuguesa.

Para além de várias outras medidas na área da informação dos consumidores2https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55130, merece relevo especial a disponibilização pela ANACOM, em finais de Julho, de um Observatório de Tarifários desenvolvido em estreita colaboração com os três operadores móveis - cuja participação voluntária aproveito aliás para agradecer publicamente - e que oferece aos consumidores a possibilidade de consulta, análise e comparação dos tarifários disponíveis no mercado. É com satisfação que anuncio que é hoje disponibilizada ao público a segunda fase deste projecto que alarga as opções disponíveis para os utilizadores, designadamente a inclusão dos preços de SMS e MMS, o que reforçará, estou confiante, a elevada aceitação que esta iniciativa já teve.


4. Avaliação das Condições Actuais

A intervenção do regulador em 2005 foi orientada por dois objectivos principais: o reforço das condições concorrenciais e a redução de alguns preços pagos pelo consumidor que se encontravam desalinhados dos padrões médios europeus. A opção do regulador foi clara: privilegiou-se um movimento muito rápido de aproximação a condições adequadas às características específicas da realidade portuguesa.

Neste contexto os ajustamentos das ofertas grossistas - área prioritária de intervenção do regulador sectorial - foram extremamente acentuados: a instalação do lacete local reduziu-se em cerca de 60 por cento, a respectiva mensalidade em cerca de 20 por cento, o preço do acesso agregado em cerca de 50 por cento, a mensalidade do acesso local para uma oferta de 2 Mbps em cerca de 35 por cento, os preços de interligação em cerca de 10 por cento e, finalmente, as terminações dos operadores móveis em cerca de 30 por cento.

A magnitude destas reduções ilustra, de uma forma clara, que as condições concorrenciais estavam longe de ser as desejáveis; mas indica também que o regulador optou por um ajustamento rápido aos níveis pretendidos, não sendo naturalmente razoável extrapolar reduções desta magnitude para o futuro.

Como já foi divulgado, a ANACOM irá submeter a consulta pública, previsivelmente ao longo do mês de Novembro, as novas condições grossistas que irão vigorar a partir de 1 de Janeiro do próximo ano. Estaremos assim numa situação de conhecimento com uma antecedência sem precedentes de todos os preços das ofertas grossistas a vigorar em 2006, o que permite aos operadores desenvolverem as suas ofertas com a necessária antecedência. O grau de previsibilidade das condições de mercado é assim extremamente elevado, com os decorrentes benefícios para os operadores e para o funcionamento dos mercados financeiros.

Na avaliação do regulador, as condições das ofertas grossistas disponíveis - em termos de preços e de prazos - aproximaram-se de uma forma muito rápida aos níveis adequados às características específicas da realidade portuguesa. Encontram-se assim reunidas as condições para que, em 2006, se viva um ambiente de concorrência generalizada - porventura sem precedentes no sector - com os decorrentes benefícios para os consumidores em termos de preços, qualidade e diversidade.

Podemos assim concluir que o regulador utilizou os instrumentos de regulação não estrutural cuja utilização foi considerada adequada face às falhas de mercado identificadas e às características específicas da realidade portuguesa. Como o efeito das medidas de regulação no funcionamento dos mercados se produz com algum desfasamento, justifica-se agora que se dê algum tempo para analisar a extensão dos benefícios para os consumidores, decorrentes das escolhas do regulador.
 

5. Principais Desafios para o Regulador

Assegurar igual acesso e uma utilização eficiente de infra-estruturas

Nas circunstâncias actuais, é necessário que o regulador intensifique a monitorização e fiscalização da implementação das suas decisões. Constitui, assim, um desafio importante para o regulador assegurar condições - que vão para além de preços e de prazos - de igual tratamento e de acesso à rede do operador histórico por parte dos operadores alternativos. Isto é, a actividade grossista do operador histórico deverá oferecer exactamente as mesmas condições à sua actividade retalhista e à dos novos operadores, já que a não existência de condições de igual tratamento impõe custos significativos para os consumidores.

O modelo regulatório preconizado pela ANACOM favorece uma utilização eficiente das infra-estruturas existentes. Esta utilização eficiente - que passa também pela promoção e verificação das condições de acesso às condutas da concessionária do serviço público e de outras entidades públicas - constitui um aspecto extremamente importante da promoção de condições de concorrência, criando externalidades para a economia de investimentos efectuados por vários agentes económicos.

Potenciar a inovação e a introdução de novas tecnologias

O regulador deve criar condições que assegurem a promoção da inovação e a introdução de novas tecnologias que permitam desenvolver modelos de negócio sustentáveis que se traduzam em ofertas com valor acrescentado para os consumidores. Compete-lhe assegurar um enquadramento regulatório encorajador da convergência e desenvolvimento de novas infra-estruturas, de serviços e de equipamentos, mas também com um elevado grau de previsibilidade.

A ANACOM submeteu ontem a consulta pública um conjunto de posições preliminares sobre os serviços de voz suportados na tecnologia IP (VoIP), das quais se destacam a abertura de uma nova gama de numeração para acomodar os serviços de uso nómada, questões relacionadas com a interligação, qualidade de serviço e informação a prestar aos utilizadores finais. Os serviços VoIP são já uma realidade em Portugal, contribuindo para uma maior concorrência e diversidade de serviços.

O desenvolvimento de serviços VoIP vai criar pressões sobre os tradicionais operadores de voz - em resultado das pressões descendentes sobre os custos e da redução das barreiras à entrada de novos operadores - e conduzirá inevitavelmente a reduções de preços ao consumidor final. Adicionalmente, porá em causa os sistemas de tarifação mais comuns, baseados na duração e na distância. Em antecipação destas tendências, a ANACOM submeteu já a consulta pública alguns projectos de decisão - estou-me a referir, em particular, à tarifa plana de interligação, à oferta de realuguer de linha de assinante e às condições associadas à disponibilização, pelo operador histórico, de ofertas agregando, num preço único, linha de rede e tráfego - que contribuem para uma transição gradual do mercado face à introdução de novas soluções tecnológicas.

A regulação tem de acompanhar e adaptar-se à evolução dos mercados. É neste sentido que se iniciará no final deste ano, a nível da União Europeia, o processo que levará à revisão do actual quadro regulamentar. Este processo - que a ANACOM está a acompanhar de uma forma activa no âmbito do IRG, de forma a assegurar soluções adequadas à realidade portuguesa - vai requerer, naturalmente, a participação de todos os interessados.


Assegurar uma utilização eficiente do espectro

É missão do regulador praticar uma gestão do espectro que promova uma utilização efectiva e eficiente das frequências - que constituem um recurso escasso da economia - tendo por base critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.  A gestão eficiente do espectro é, aliás, um instrumento privilegiado para a promoção da concorrência e da inovação.

A ANACOM irá promover, oportunamente, consultas públicas que contemplem uma reapreciação do actual sistema tarifário do espectro radioeléctrico e, também, um enquadramento aplicável à transmissibilidade dos direitos de uso do espectro.


Dinamizar o conhecimento no sector

No Plano de Actividades 2006-2008, a ANACOM assumiu o compromisso de contribuir de uma forma activa para um maior conhecimento no sector das comunicações através, nomeadamente, da publicação de estudos sobre o sector, reformulação das publicações da instituição e da realização de seminários.

Neste contexto tenho o prazer de anunciar a realização da 1ª Conferência da ANACOM, a ter lugar em Maio do próximo ano. Para além de painéis temáticos com a participação de especialistas do sector - nacionais e internacionais - foi endereçado um convite à academia para apresentar comunicações sobre uma vasta lista de temas, o que permite também reforçar os laços entre a entidade reguladora e a comunidade científica portuguesa.

Como referido anteriormente nesta intervenção, o efeito das medidas de regulação produz resultados no mercado com algum desfasamento, justificando-se, por isso, que seja dado algum tempo para avaliar o impacto das medidas tomadas nos últimos 12 meses. Assumo hoje o compromisso de, na conferência de Maio de 2006, proceder a uma nova avaliação dos resultados da regulação adoptada pela ANACOM, à luz dos objectivos estratégicos da instituição: promover mercados abertos e concorrenciais; potenciar benefícios para os consumidores; potenciar a inovação e o investimento em infra-estruturas.

Muito obrigado.

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1 Medido como rácio entre o número total de acessos de banda larga e a população total.
2 Refiram-se também três outras medidas nesta área: aprovação do projecto de regulamento de qualidade de serviço aplicável às empresas que prestam o serviço de acesso à rede telefónica pública em local fixo e serviço telefónico em local fixo; definição das linhas de orientação sobre o conteúdo mínimo dos contratos para prestação de serviços de comunicações electrónicas; definição do objecto e forma de disponibilização ao público das condições de oferta e de utilização de serviços de comunicações electrónicas.