Resolução do Conselho de Ministros n.º 12/2019, de 21 de janeiro



Presidência do Conselho de Ministros

Resolução do Conselho de Ministros


A proteção, socorro e assistência das populações face a riscos coletivos são direitos essenciais, e que se revestem de particular importância perante a dimensão das catástrofes e o potencial de vítimas delas resultantes, a par dos impactos psicológicos e socioeconómicos nas populações atingidas, em particular, e no país como um todo. Nesse sentido, as estruturas de proteção civil, trabalhando num quadro multissetorial, têm como metas fundamentais a prevenção de riscos coletivos inerentes a situações de acidente grave ou catástrofe, a atenuação dos seus efeitos e a proteção e socorro das pessoas e bens em perigo, quando aquelas situações ocorram, tal como preconizado na Lei de Bases da Proteção Civil.

O passado mostrou o impacto dramático dos grandes incêndios rurais nas vidas dos portugueses, com perda de vidas, bens e milhares de hectares de floresta. Esta evidência consta dos relatórios das duas Comissões Técnicas Independentes criadas no seio da Assembleia da República. E dela decorre a vontade firme de mudança do paradigma nacional em matéria de prevenção e combate aos fogos rurais, de que são expressão as orientações aprovadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 157-A/2017 Link externo.https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/114109966/details/normal?l=1, de 27 de outubro, os princípios expressos na Diretiva Única de Prevenção e Combate, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 20/2018 Link externo.https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/114782541/details/normal?l=1, de 1 de março, e, em geral, o Programa do XXI Governo Constitucional em matéria de valorização do território, em particular do interior. Com efeito, o Governo tem vindo a implementar um novo modelo de atuação, que preconiza uma maior e efetiva segurança das pessoas face a acidentes graves e catástrofes e uma atitude preventiva de proteção civil, resultando na adoção de um modelo integrado e especializado para a gestão do fogo rural, procurando garantir que o fogo não constitua uma ameaça para as populações, nem tão-pouco um potencial de dano para pessoas, património e ambiente.

Neste quadro, foi instituído um sistema integrado de gestão de fogos rurais, cujo planeamento, coordenação estratégica e avaliação compete à Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, I. P. (AGIF, I. P.).

A mudança de paradigma que o novo sistema implica potencia o compromisso, a colaboração e o envolvimento de todas as entidades cujas missões contribuem para gerir fogos rurais, como a AGIF, I. P., o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF, I. P.), a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), a Guarda Nacional Republicana (GNR), as Forças Armadas, os Corpos de Bombeiros, e todos os agentes privados, onde se incluem as empresas do setor, organizações de produtores florestais, os proprietários florestais não associados e os cidadãos. Juntamente com estas entidades, os municípios são, pela proximidade ao cidadão e pela informação que lhe é disponibilizada quanto às melhores práticas, quer nas ações de preparação dos aglomerados populacionais para melhor resistir aos incêndios, quer ainda no adequado enquadramento das tradicionais práticas agrícolas e silvícolas com recurso ao fogo, bem como no apoio à supressão, relevantes agentes de transformação, com as suas responsabilidades locais de proteção civil e com o apoio dos gabinetes técnicos florestais.

A solução para o problema que trouxe Portugal e os portugueses a este importante e sério momento da nossa história coletiva exige uma só voz que inspire, mobilize, responsabilize e integre as ações que se mostram necessárias, e que levarão à transformação de um modelo que elevou a resposta no combate e que, agora, deverá fazer-se acompanhar por uma prevenção, preparação e partilha de objetivos muito ativa. Prevenção e combate devem constituir dois pilares integrados numa cadeia de valor mais vasta, sem silos de conhecimento ou intervenção, com o aproveitamento, a bem da comunidade, das melhores competências e conhecimento.

A gestão integrada do fogo rural é um compromisso para mudar o futuro da paisagem e do território, assumido em favor de todos os portugueses que sobreviveram a incêndios rurais e que procuram a definição clara de papéis e de uma missão e visão, revestidos de desígnio nacional, que recorda o quanto depende de todos e de cada um, das organizações e dos cidadãos.

Assim:

Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:

1 - Aprovar a missão do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), que é a de proteger o território, pessoas e bens dos incêndios rurais, a qual se materializa na especialização, com responsabilidades claras na gestão do território rural e na proteção das pessoas e do edificado contra incêndios rurais, e na integração, com o pleno conhecimento e ação conjunta quer nos processos de prevenção, quer nos de supressão do fogo.

2 - Aprovar a visão do SGIFR, «Portugal protegido de incêndios rurais graves», que traduz a ambição que todo o sistema e, por inerência, todas as entidades que o integram têm na procura do sucesso deste desígnio nacional.

3 - Estabelecer que a visão do SGIFR é apoiada por uma cultura de mobilização total, por via do sentido de missão, da ambição de superação permanente, da responsabilidade na execução, da integração do trabalho, da melhoria contínua e da flexibilidade na gestão.

4 - Confiar à Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, I. P. (AGIF, I. P.), a coordenação estratégica do SGIFR, ao Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF, I. P.), a coordenação da prevenção em solo rústico, e à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) a coordenação da prevenção em solo urbano e sua envolvente (dos aglomerados populacionais, áreas industriais e outras infraestruturas utilizadas por pessoas) participando ambas as entidades na definição das medidas para cada tipo de solo, e à ANEPC o comando das operações de supressão.

5 - Confiar à Guarda Nacional Republicana (GNR) a coordenação da fiscalização, da vigilância, da deteção e o apoio às operações de prevenção e de supressão, de acordo com as orientações estratégicas do SGIFR e as necessidades identificadas pelo ICNF, I. P., e pela ANEPC.

6 - Aprovar, como objetivos estratégicos de atuação no âmbito do SGIFR:

a) Valorizar os espaços rurais, porque estes territórios precisam de ser vividos e sentidos pelos portugueses e pelas entidades e organizações como fatores geradores de riqueza;

b) Cuidar dos espaços rurais, porque estes territórios, uma vez reconhecido o seu valor, têm de ser cuidados e preservados mediante o uso de práticas compatíveis com a segurança dos cidadãos;

c) Modificar comportamentos, porque a segurança dos portugueses e a preservação de um território produtivo e seguro em muito dependem de comportamentos responsáveis, evitando as ignições e tomando as melhores decisões de proteção individual e coletiva;

d) Gerir o risco eficientemente, porque as decisões devem ser tomadas de modo a reduzir as perdas, numa definição clara de prioridades e de uso eficiente de recursos públicos, sempre limitados para atender a múltiplos desafios.

7 - Adotar uma cadeia de valor dos incêndios rurais, mediante uma ligação que estende a atenção das entidades para as atividades prévias à prevenção e posteriores à supressão dos incêndios, quebrando a polarização sobre dois silos, ou polos, tradicionalmente estanques, em favor de uma abordagem iterativa que contempla:

a) O Planeamento: coordenado pela AGIF, I. P., englobando a definição de diretrizes estratégicas, que declinam para instrumentos de gestão de escala regional e municipal, as diretrizes operacionais desenhadas por cada entidade do SGIFR, que operacionalizam a estratégia nacional às mesmas escalas, e a produção de informação consolidada do orçamento global do sistema, com base nos orçamentos de cada entidade e respetivas fontes de financiamento;

b) A Preparação: com a contratação de recursos, humanos e técnicos, para complementar os meios permanentes, realizada no âmbito da missão de cada entidade do SGIFR, a educação e sensibilização, orientada para a expansão do conhecimento, modificação de comportamentos e adoção de medidas de autoproteção, estrategicamente coordenada pela AGIF, I. P., e a fiscalização do cumprimento das medidas de prevenção e sinalização das situações de incumprimento, confiada à GNR;

c) A Prevenção: com a especialização na gestão de território com solo rústico, para um território preparado para uma melhor gestão do fogo, a cargo do ICNF, I. P., a preparação do território edificado e aglomerados populacionais, a cargo da ANEPC e dos municípios, e a verificação das condições de segurança, no terreno, no âmbito da missão de cada entidade do SGIFR;

d) A Pré-Supressão: com a instituição de uma estrutura para o apoio à decisão, prevendo mecanismos de interpretação meteorológica e aviso às populações, operacionalizada pela ANEPC com a participação técnica da AGIF, I. P., do ICNF, I. P., da GNR e das Forças Armadas, a fase de alerta, operacionalizada pela ANEPC, a vigilância em áreas críticas operacionalizada pela GNR, e de modo supletivo pela presença dissuasora em treino operacional das Forças Armadas, e o pré-posicionamento de meios de supressão e socorro das entidades do SGIFR;

e) A Supressão: englobando a fase ataque inicial (ATI) e ataque ampliado (ATA), rescaldo e extinção, o restabelecimento de segurança e resposta de emergência social e ambiental, confiados ao comando operacional da ANEPC, com o empenhamento dos Bombeiros e de todas as entidades do SGIFR, em sede de gestão de operações e em função da capacitação;

f) O Pós-evento: com a investigação de causas, confiada à GNR, a reabilitação, operacionalizada pelo ICNF, I. P., nas áreas públicas sob sua gestão, pelos municípios e pelas pessoas singulares ou coletivas de natureza privada detentoras de espaços florestais e ainda pelas organizações de produtores florestais, pelas entidades gestoras de zonas de intervenção florestal e pelas entidades gestoras de baldios, e as lições aprendidas e melhoria contínua, responsabilidade de todas as entidades e confiada à coordenação da AGIF, I. P., em colaboração com todas as entidades do SGIFR.

8 - Estabelecer que o planeamento, em sede do SGIFR, é um processo iterativo, com a definição de diretrizes estratégicas e operacionais de nível nacional, que resultam na execução das ações de preparação do território ao nível municipal.

9 - Estabelecer que o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (PNGIFR), a entregar ao Governo até 30 dias após a publicação da presente resolução, define as grandes linhas de ação do SGIFR no horizonte 2019-2030, de acordo com o disposto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 157-A/2017 Link externo.https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/114109966/details/normal?l=1, de 27 de outubro, constituindo o modelo organizativo, o encadeamento processual e o modelo de capacitação do sistema, conforme o programa de transformação gradual nele inscrito.

10 - Estabelecer que o PNGIFR é sujeito a uma revisão anual, mediante o relatório de análise coordenado pela AGIF, I. P., incorporando os indicadores de realização municipais.

11 - Estabelecer que todos os elementos de planeamento produzidos pelos municípios são submetidos em plataforma informática gerida pela AGIF, I. P.

12 - Determinar que o SGIFR envolve a capacitação dos profissionais e dos sistemas de apoio à decisão, nos moldes seguintes:

a) Reforçar o Sistema de Gestão de Operações, garantindo que, no contexto da operação de proteção e socorro, todas as funções nele previstas são desempenhadas por recursos humanos com o perfil e competência necessários, independentemente da sua entidade de origem e estatuto, conforme práticas internacionais;

b) Incrementar o recurso a laboratórios colaborativos, centros de investigação e outras fontes de conhecimento científico, designadamente na realização de protocolos, na colaboração em projetos de investigação e em acolhimento de estagiários nas entidades do SGIFR, para incremento da capacidade preditiva em apoio ao planeamento e decisão na preparação, pré-supressão e supressão;

c) Confiar à AGIF, I. P., a construção de uma plataforma informática de interoperabilidade entre entidades, públicas e privadas, com componente geográfica para recolha, centralização e disponibilização de informação de planeamento, previsão, apoio à decisão, avaliação expedita de potenciais prejuízos, levantamento de danos e gestão de fogos rurais, a operacionalizar durante 2019.

13 - Confiar à coordenação da AGIF, I. P., o desenho conjunto de uma estratégia, uniforme e colaborativa, de comunicação à população de informações pertinentes para a sua segurança e adaptação de comportamentos a aplicar por todas as entidades do SGIFR mediante aprovação do membro do Governo que exerça a tutela sobre a AGIF, I. P.

14 - Determinar que a presente resolução entra em vigor no dia seguinte ao da sua aprovação.

Presidência do Conselho de Ministros, 25 de outubro de 2018. - O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.