2. Diretiva GSM


Na sua versão original, a Diretiva GSM (Diretiva n.º 87/372/CEE) reservava a utilização de parte da faixa dos 900 MHz às tecnologias de acesso baseadas na norma GSM (Global System for Mobile), nomeadamente para o serviço móvel terrestre. Em 2009, esta diretiva foi alterada pela Diretiva n.º 2009/114/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro, passando a permitir a utilização da faixa dos 900 MHz para o fornecimento de serviços pan-europeus mais rápidos (incluindo a faixa designada como “faixa extensão” do GSM), como a Internet móvel, e garantindo simultaneamente a continuidade dos serviços GSM. Esta maior flexibilidade teve como objetivo possibilitar a prestação de outros serviços pan-europeus, em particular os sistemas UMTS, a partir do momento em que se demonstrou que estes sistemas poderiam coexistir com os sistemas GSM. Em particular, visava-se permitir a implantação mais rápida e generalizada dos serviços de banda larga sem fios, promovendo a concorrência.

Neste contexto, importa salientar o que é referido no considerando 6 da Diretiva n.º 2009/114/CE, a saber: “a liberalização da utilização da banda de 900 MHz poderá eventualmente causar distorções da concorrência. Em particular, os operadores de serviços de comunicações móveis a quem não tenham sido atribuídos segmentos de espectro na banda de 900 MHz poderão ver-se em desvantagem, em termos de custos e de eficiência, face aos operadores que irão poder fornecer serviços de terceira geração naquela banda. Nos termos do enquadramento normativo das comunicações electrónicas, e em particular da Directiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas (Directiva «Autorização»), os Estados-Membros podem alterar e rever os direitos de utilização do espectro, dispondo assim dos instrumentos necessários para eliminar as referidas distorções”.

O Considerando n.º 7 da mesma Diretiva acrescenta ainda que os Estados Membros devem determinar “se a aplicação da Diretiva poderá distorcer a concorrência nos mercados de comunicações móveis em causa e, se concluírem que é esse o caso, deverão determinar se se justifica objetivamente, e se constitui uma solução proporcionada para resolver o problema, alterar os direitos de utilização atribuídos aos operadores que utilizam a banda de 900 MHz e, quando proporcionado, proceder à revisão e redistribuição desses direitos de utilização, de modo a corrigir tais distorções”.

Esta necessidade de uma avaliação do mercado das comunicações móveis a ser levada a cabo pelos Estados Membros, preconizada nos acima referidos considerandos da Diretiva n.º 2009/114/CE é concretizada no n.º 2 do seu artigo 1.º, onde se dispõe que, no âmbito da sua implementação, “os Estados-Membros devem determinar se a actual distribuição de frequências na banda de 900 MHz pelos operadores de comunicações móveis concorrentes nos respectivos territórios é susceptível de distorcer a concorrência nos mercados móveis em causa e, nos casos em que tal se justifique e constitua uma solução proporcionada, devem tomar as medidas necessárias para eliminar tais distorções”, nos termos do artigo 14.º da Diretiva Autorização1.

O designado processo do refarming, ocorrido em Portugal em 2010, que resultou, para além da implementação da Diretiva GSM (alterada), da implementação da Decisão n.º 676/2002/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 7 de março de 20022 e da Decisão da Comissão 2009/766/CE, de 16 de outubro de 20093 (alterada posteriormente pela Decisão 2011/251/UE, de 18 de abril de 2011), traduziu-se essencialmente em duas medidas4:

a) A alteração do Quadro Nacional de Atribuição de Frequências (QNAF)5, por forma a eliminar as restrições tecnológicas inicialmente impostas à utilização das faixas de frequências dos 900 MHz e dos 1800 MHz para o serviço móvel terrestre (SMT), bem como a suprimir a distinção entre tecnologias e faixas de frequências utilizadas para a prestação do mesmo serviço (princípios da neutralidade tecnológica e de serviços); e

b) A unificação num mesmo título dos direitos de utilização de frequências atribuídos aos operadores móveis, abrangendo quer as faixas de frequência dos 900 MHz e dos 1800 MHz, quer a faixa dos 2,1 GHz (UMTS)6, incluindo a fixação de condições específicas no âmbito dos respetivos direitos de utilização, permitindo que o cumprimento das obrigações de cobertura, quer para os serviços de voz, quer para os serviços de dados, pudesse ser assegurado por qualquer dos sistemas (GSM e UMTS) ou outros sistemas que viessem a ser autorizados.

Tendo em conta que (i) a adoção destas medidas foi precedida de duas consultas públicas no âmbito das quais os operadores e as associações de consumidores tiveram oportunidade de se pronunciar e que (ii) os três operadores móveis em atividade detinham uma quantidade equivalente de espectro nas faixas dos 900/1800/2100 MHz, o ICP ANACOM não identificou qualquer situação de distorção da concorrência no mercado móvel.

Com efeito, no âmbito do processo de refarming não foram consignadas frequências adicionais ou atribuídos novos direitos de utilização aos operadores móveis existentes, mas somente se procedeu à aplicação do princípio da neutralidade tecnológica no âmbito dos títulos respetivos considerando, nomeadamente os termos das Decisões comunitárias relevantes.

Não obstante, antes da realização do Leilão Multifaixa em 2011 e perante a iminência da disponibilização de uma quantidade de espectro de elevado valor económico, designadamente nas faixas dos 800 MHz e dos 900MHz, medida com impacte estruturante e decisivo para o futuro do mercado das comunicações eletrónicas móvel, o ICP-ANACOM, tendo em conta as consultas realizadas e os dados estatísticos de que dispunha estabeleceu no Regulamento do Leilão medidas destinadas a promover a concorrência no mercado móvel, conforme abaixo se demonstrará.

Notas
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1 Transposto para o ordenamento jurídico nacional pelo artigo 20.º da Lei das Comunicações Eletrónicas.
2 Relativa a um Quadro Regulamentar para a política do Espectro de Radiofrequências (Decisão Espectro de Radiofrequências).
3 Relativa à harmonização das faixas de frequências dos 900 MHz e dos 1800 MHz para sistemas terrestres capazes de fornecer sistemas pan-europeus de Comunicações Eletrónicas na Comunidade.
4 De notar que a Diretiva GSM somente abrange a faixa dos 900 MHz, relevando-se que no âmbito destas Decisões consta também a faixa dos 1800 MHz, considerando que entretanto o sistema GSM foi também harmonizado, com sucesso, naquela faixa.
5 Deliberação de 31 de março de 2010, mediante a qual o ICP-ANACOM aprovou o QNAF a vigorar em 2009/2010, bem como o relatório da respetiva consulta pública, lançada a 23 de dezembro de 2009. Disponível em 'QNAF 2009/2010 (consulta encerrada)https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1019286'
6 Deliberação de 8 de julho de 2010, mediante a qual o ICP-ANACOM decidiu, no contexto do refarming do espectro radioeléctrico nas faixas de frequências de 900 MHz e 1800 MHz, unificar, num título, as condições aplicáveis ao exercício dos direitos de utilização de frequências atribuídos à Optimus, à TMN e à Vodafone Portugal para a prestação do serviço móvel terrestre, de acordo com as tecnologias GSM 900/1800 e UMTS, e aprovou o relatório da audiência prévia dos interessados e do procedimento geral de consulta a que foi submetido o correspondente sentido provável de decisão, na sequência de deliberação de 31 de março de 2010.